Análise

ANÁLISE: Entenda os bastidores do protesto da Renault contra a Racing Point

Diretor da Renault explica a fundamentação por trás do protesto apresentado pela equipe contra a Racing Point no domingo

Lance Stroll, Racing Point RP20 and Sergio Perez, Racing Point RP20

Lance Stroll, Racing Point RP20 and Sergio Perez, Racing Point RP20

Andy Hone / Motorsport Images

O protesto submetido pela Renault contra a Racing Point após o GP da Estíria de Fórmula 1 não surpreendeu ninguém, já que muitas rivais não estavam felizes com a evolução da equipe britânica mostrada na pré-temporada em Barcelona com o RP20.

A velocidade impressionante que o carro mostrou na pista, mesmo que não tenha se traduzido nos resultados que o potencial sugere, chamou ainda mais a atenção das equipes.

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No GP da Estíria, Sergio Pérez largou apenas em 17º após uma problemática classificação no molhado e, mesmo assim, conseguiu estar em quinto em certo momento da prova, lutando contra a Red Bull de Alex Albon pelo quarto posto.

O mexicano surpreendeu os rivais com um bom ritmo mesmo com pneus macios desgastados, e por conseguir várias voltas mais rápidas após a troca para o composto médio. Já que o rumor de um protesto já existia desde Barcelona, a única surpresa é que ele não foi protocolado já no GP da Áustria.

Não era uma questão da Renault estar esperando uma oportunidade para uma exclusão da Racing Point, que pode render pontos para a equipe francesa.

Na verdade, o motivo do atraso foi o mesmo pela qual a Red Bull ter protestado contra o sistema DED da Mercedes na sexta antes do GP da Áustria em vez de depois da classificação ou da corrida, quando poderia causar um impacto maior.

"Para ser honesto, estávamos planejando fazer isso em Melbourne, e não tivemos a oportunidade de fazer isso lá", disse o diretor executivo da Renault Marcin Budkowski ao Motorsport.com.

"E a razão pela qual não fizemos isso na semana passada é porque a FIA e a F1 se esmeraram muito para fazer a temporada começar. Então queríamos respeitar isso, e aplaudimos o trabalho que eles tiveram".

"Fizemos na segunda corrida porque, novamente, tivemos a oportunidade. Essa é a razão pela espera, mas é algo que já havíamos notado em Barcelona".

De fato, na segunda corrida, a Renault decidiu que tudo estava em jogo. Foi apenas coincidência que, nesta prova, um dos pilotos, Daniel Ricciardo, terminou atrás dos dois carros rosas.

Budkowski se recusou a comentar, mas outras equipes do pitlane também demonstraram não terem gostado da evolução, e fontes sugeriram que, de modo privado, algumas equipes apoiaram o protesto da Renault, mesmo que seus nomes não estejam ligados ao documento oficial. Afinal, apenas uma equipe precisa se manifestar para que a roda se mexa.

Daniel Ricciardo, Renault F1 Team R.S.20, leads Lance Stroll, Racing Point RP20

Daniel Ricciardo, Renault F1 Team R.S.20, leads Lance Stroll, Racing Point RP20

Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images

Então, qual é a razão deste protesto e por que ele foca nos dutos de freios?

O caso se relaciona à já controversa questão de partes listadas e o que as equipes podem ou não comprar ou emprestar das rivais.

Chassi e superfície aerodinâmica sempre foram vistos como elementos chaves para que as equipes desenvolvam sozinhos, como propriedade intelectual própria, enquanto itens como câmbio e suspensão estão livres. Todos os detalhes são explicados no Apêndice 6 do Regulamento Esportivo da FIA.

Os dutos de freio, que possuem uma influência chave na aerodinâmica bem clara, se tornou uma parte listada para a temporada 2020.

"Basicamente entendemos que os dutos de freio dianteiro e traseiro usados na Racing Point são efetivamente um design da Mercedes, e, então, foram projetadas por outro competidor", disse Budkowski.

"Isso representa uma quebra no regulamento esportivo, mais precisamente o Apêndice 6, portanto protestamos sobre isso".

"Em primeiro lugar, os dutos de freio são partes listadas, porque eles criam uma diferença de performance, sendo um componente sensível à aerodinâmica. E eles são cruciais no controle de temperatura dos pneus, o que todos sabem que causam uma grande diferença de performance na F1".

"E eles são regulados pelo Apêndice 6, então acreditamos que esse formato em uso na Racing Point é, efetivamente, o design exato da Mercedes do ano passado, com algumas pequenas mudanças em potencial para adaptação à Racing Point, ou pequenas evoluções. Mas, de qualquer jeito, não é um design da Racing Point".

"Então isso não é propriedade intelectual deles, o que explica a quebra no regulamento".

O protesto foi aceito pelos fiscais da FIA no Red Bull Ring, e haverá uma audiência no futuro, após a coleta de todas as evidências. Budkowski reforçou que não é o trabalho da Renault demonstrar que sua rival burlou o regulamento.

"Não cabe a nós provar isso, cabe à Racing Point. No regulamento da F1, é função do competidor provar que seu carro é legal o tempo todo. Então será a função deles provar a legalidade do carro".

Ninguém tem um problema com uma equipe copiar asas e outras partes - todos sempre estão de olho no que os rivais estão fazendo, pegando as melhores ideias. Mas o caso do RP20 é incomum, por ser, em geral, um pacote muito similar à Mercedes W10.

De fato, a Racing Point não escondeu em nenhum momento que pegou um atalho para melhorar sua performance ao copiar o conceito da Mercedes, após chegar ao limite com o pacote inspirado na Red Bull que vinha usando.

Obviamente, aqui não era a McLaren ou a Alfa Romeo ou a própria Renault copiando o conceito da Mercedes, mas sim uma equipe que usa a unidade de potência da montadora, e até o túnel de vento. Então isso causou um certo desconforto entre os rivais.

A chave é o sistema de fluxo interno dos dutos de freio do RP20, que será comparado pela FIA com os dutos usados pela Mercedes em 2019. A argumentação da Renault é que o detalhe interno não é visível para quem vê de fora e, assim, teoricamente, você não conseguiria replicar com precisão sem ter acesso a informação interna.

"Nosso argumento é que o design não é deles", disse Bodkowski. "E há similaridades na geometria, o que é algo óbvio para ser visto, mas há a geometria interna e externa. A externa você pode copiar através de fotos, mas a interna é mais difícil. Não sei como será, mas cabe à FIA determinar as similaridades".

"Além disso, é de se perguntar: houve uma parte de projetos e partes? Acreditamos que sim. Potencialmente, de modo legal, mas mesmo assim, se era legal a troca no ano passado, a norma mudou para esse ano".

"Então a FIA terá que determinar não apenas as geometrias, mas também se houve troca de informação entre os competidores que levou a esse design".

É possível resumir que a Renault está assumindo que os dutos são idênticos internamente, ou similares demais para ser uma coincidência. Mas a FIA também pode determinar que eles são diferentes o suficiente.

Racing Point RP20 detail

Racing Point RP20 detail

Photo by: Giorgio Piola

"O que estamos dizendo é que aceitamos que é possível copiar a geometria externa através das fotos", disse Budkowski. "Mas não acreditamos que seja possível copiar a geometria interna. Além disso, sabemos que transferências de informações sobre os dutos de freios eram permitidos no ano passado. Mas isso não permite que eles sejam usados nos carros desse ano".

"Essas partes não estavam listadas no ano passado e estão listadas nesse ano, então você poderia trocar informações no ano passado, mas não usar no carro desse ano. Então, se eles usaram informações recebidas da Mercedes de 2019 no carro de 2020, acreditamos que não seja legal".

"Quem vai determinar isso é a FIA. Mas o que é claro é que qualquer parte listada precisa ser de design proprietário. O regulamento é claro. Você não pode só projetar a parte, mas também não pode entregar para outro competidor".

"Se um competidor projeta, ele tem direito de exclusividade sobre isso. Então não tem como você basear seu design no de outro sem quebrar o regulamento.

A Renault acha que outros elementos do carro podem ter quebrado essa regra?

"Temos fortes suspeições, se não convicção, que essas partes são um design de outro competidor. Se isso também aconteceu com outras peças, quem vai determinar é a FIA".

"Se a FIA descobrir que os dutos têm a mesma geometria ou são baseadas na mesma geometria, então eu esperaria que eles começassem a checar outras partes também".

Claramente esse é um assunto muito significante para o esporte. A FIA está se movimentando para um regulamento que incentiva partes compartilhadas e comuns a partir de 2022, e encontrou resistência e algumas áreas, mesmo em elementos que não tornam o carro mais rápido.

Porém, a aerodinâmica continua sendo um aspecto chave da performance que as equipes querem manter livre, afirmando que uma equipe precisa fazer sua própria pesquisa e desenvolvimento, não sendo possível comprar performance.

Enquanto isso, a movimentação para o regulamento de 2022 vem em meio ao teto orçamentário e uma restrição no uso do túnel de vento. Qualquer operação próxima entre equipes parceiras, que podem se beneficiar mutualmente de um caminho conjunto de desenvolvimento, será visto como suspeito pelos demais.

A Racing Point reagiu de modo forte à reclamação da Renault, chamando o processo de "mal concebido e mal informado", destacando que "qualquer sugestão de transgressão é rejeitada firmemente, e a equipe tomará todos os passos necessários para garantir a aplicação correta do regulamento e dos fatos".

O problema real da Racing Point é que ela evoluiu muito com seu pacote, a ponto de não só rivalizar com as equipes do meio do grid como Renault e McLaren, mas incomodando também as da ponta, Red Bull e Ferrari

Sergio Perez, Racing Point RP20

Sergio Perez, Racing Point RP20

Photo by: Charles Coates / Motorsport Images

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