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Reginaldo Leme comenta má fase da Ferrari e explica crises da equipe na F1

Principal comentarista de automobilismo do Brasil, jornalista deu detalhes de bastidores do time de Maranello

Ferrari logo

Maior campeã da história da Fórmula 1, a Ferrari vive grande crise em 2020. Apesar dos pódios do monegasco Charles Leclerc nos GPs de Áustria e Grã-Bretanha, a escuderia vem sofrendo com o novo carro e ocupa apenas a quarta posição entre os construtores.

O alemão Sebastian Vettel, tetracampeão mundial, é somente o 13º do campeonato. O piloto deixará o time no fim do ano, mas nada muda o pessimismo ferrarista. O presidente-executivo John Elkann, inclusive, chegou a afirmar que a equipe só voltará a brigar por títulos em 2022.

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Caso a previsão do mandatário se confirme, a escuderia italiana completará 14 anos sem títulos na F1. A última conquista foi o Mundial de Construtores de 2008, quando Felipe Massa foi vice no Brasil. Entre pilotos, o último campeão foi o finlandês Kimi Raikkonen, em 2007.

Para analisar o contexto atual do time de Maranello, o Motorsport.com entrevistou Reginaldo Leme, principal comentarista de automobilismo do País. O jornalista acompanha a F1 desde o começo dos anos 1970 e chegou a conhecer o fundador da montadora, Enzo Ferrari. 'Regi' contou passagens marcantes da equipe vermelha e também deu o retrospecto histórico da equipe na categoria máxima. É o que você confere no vídeo imperdível abaixo:

"A Ferrari sempre foi a grande equipe e a grande paixão de todo o mundo. Na década de 1970, ficar quatro anos sem ganhar campeonato, como ficou na época em que o Jacky Ickx era o piloto principal da equipe... Ficar uns quatro anos sem ganhar campeonato já era uma catástrofe. Depois que o Lauda ganhou (pela Ferrari em 77), [a equipe] veio a ganhar só com o Jody Scheckter, em 79, e, depois, a gente entrou naquele famoso jejum de 21 anos."

"Já nos anos 70, em que as coisas eram bem melhores [para a Ferrari], não podia passar três ou quatro anos sem um campeonato. Tanto que ela ficava trocando de gente. Pouca gente sabe: teve uma época em que a Ferrari, em 1973, passou a ser fabricada na Inglaterra. Era uma turma de ingleses fazendo um carro. Embora vermelho, tinha uma faixa amarela. Bom, foi um fracasso. Aí voltou tudo para a mão dos italianos."

"Desde então [no jejum entre 1979 e 2000], foi aquele negócio de falar: 'Meu Deus do céu, quando é que essa equipe vai reagir?'. Foi vice-campeã algumas vezes, teve pilotos geniais, como Gilles Villeneuve e outros, mas não conseguiu ganhar campeonato."

"Ganhou com Scheckter, companheiro do Villeneuve, mas o Villeneuve, no início de carreira, brilhou mais. A equipe até teve que trabalhar a cabeça do Villeneuve para ele se controlar um pouquinho. Era o caso do supertalento que, por falta de controle, acabava batendo demais".

Scheckter versus Villeneuve

"Eles tiveram um acordo no início do ano de que, se o carro fosse vencedor, a preferência seria do Scheckter. O Villeneuve aceitou porque estava tendo uma chance de fazer um campeonato inteiro pela Ferrari. Ele tinha feito uma corrida pela McLaren (Grã-Bretanha, 77)."

"Mas o grande show nas corridas era o Villeneuve. Às vezes, shows que você ficava assim: 'Meu Deus do céu, esse cara vai se matar'. Mas houve um consenso de que o Villeneuve deveria aprender com o Scheckter. E vamos lembrar que o Schumacher foi o Villeneuve do passado. O Schumacher só foi campeão quando ele botou a cabeça no lugar, que é o que acontece com todos."

As influências de Enzo Ferrari e Luca di Montezemolo

"Eu comecei a trabalhar na F1 com o Luca di Montezemolo como chefe de equipe. Tinha o engenheiro Mauro Forghieri, que era um gênio, e o carro era muito bom. A equipe era meio 'italianada', bem a cara do Montezemolo. Agora, o Comendador (Enzo Ferrari), nos anos 70, com toda a estrutura que a Ferrari tinha, não ia lá para dar ordens. Ele aparecia raramente, principalmente em corridas na Itália. 

"E eu tive a sorte, a luz de Deus me iluminou... Numa reunião em Maranello, que só foram convidados jornalistas italianos... Eu convivia tanto com os italianos que recebi convite por engano. Imagina se não fui... Foi muito legal, teve bate-papo, coquetel, jantar...".

"E aí a coisa 'estava tão à vontade' que a Dani, minha filha, estava lá comigo. Então, na hora em que acabou a parte de entrevistas, eu levei ela até o Comendador. E o fotógrafo Ercole Colombo, membro da Ferrari e amigo do Comendador, apresentou: 'Esse é um jornalista brasiliano...'. Ele (Enzo Ferrari) pegou a Dani, botou no colo e fez a foto. O Ercole tem essa foto. Ele me mandou uma cópia e estou atrás dela desesperadamente."

"Mas o Comendador era um cara assim: acessível, no sentido de ser simpático com a imprensa italiana, mas muito difícil de ser 'driblado' quando se tratava de negócios. Ele defenderia a Ferrari em qualquer situação que fosse, com razão ou sem razão. O Bernie Ecclestone conta, no livro dele, o quanto foi duro convencer a Ferrari a fazer parte da associação das equipes de F1. Ela era à parte. E falava claramente: 'Não vou me juntar a esses ingleses'."

"O próprio Comendador falava isso. Tem muitas histórias do Comendador que são sensacionais. Eu ouvia muito do Franco Lini, outro jornalista tradicional, já falecido, mas tradicional, amigaço... O Lini ocupou o cargo de team manager da Ferrari numa época, então ele tinha histórias fantásticas. Mas era isso o Comendador: essa figura mítica que aparecia muito raramente, mas tinha um jeito simpático de ser. Nas negociações, muito duro."

O 'fator italiano' da Ferrari

"É, de fato, histórico. Claro que o italiano tem uma competência igual a dos outros, mas, em design de automóvel, por exemplo, é fantástico. O italiano e o alemão, principalmente. Design de carro inglês nunca foi bom. Hoje tem a Land Rover, mas aqueles carros do passado eram negócios 'incríveis'. Só que eles tinham capacidade administrativa. O que eu sempre via acontecer é que, quando a equipe era 100% italiana, a coisa não funcionava."

"Eu acho que é meio o jeito italiano de ser. Eu sou descendente de italiano. É bem o jeito de ser, de levar as coisas, de, numa discussão, ser extremamente emotivo. E a gente sabe que, na F1, as pessoas têm que cair para o racional."

"E acho que essa é uma das razões pelas quais [deu certo] na época do Schumacher, com o comando francês do Jean Todt, um projetista sul-africano, que é o Rory Byrne, o Ross Brawn, inglês, comandando, e tinha outros... Italiano era só do segundo escalão para baixo."

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