ANÁLISE: Entenda por que penalizações por troca de motor são "mal necessário" para a F1 apesar de críticas

Criticado pelos fãs, regulamento é a única saída existente no momento para evitar gastos descontrolados com motores

Valtteri Bottas, Mercedes W12

Com a Fórmula 1 se encaminhando para as cinco corridas finais de uma temporada marcante, tanto Lewis Hamilton quanto Max Verstappen já tomaram punições por trocas na unidade de potência. E caso um deles precise adotar novos elementos, com eventos recentes sugerindo que o piloto da Mercedes estaria mais próximo disso, o movimento pode ser determinante em um ano disputado.

Claro, um campeonato é conquistado e perdido ao longo de uma temporada completa, 22 corridas no caso deste ano.

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Por mais que sejam odiadas, as penalizações existem na F1 por bons motivos. O objetivo é reduzir os gastos ao manter um limite no número de componentes físicos que as montadoras têm que produzir por temporada, enquanto ao mesmo tempo forçam as marcas no desenvolvimento, buscando produzir peças que tenham uma vida útil maior.

Sem isso, a escalada dos custos poderia custar a presença das montadoras na F1, porque elas não poderiam justificar seus envolvimentos financeiros. E isso criaria ainda uma diferença maior de performance entre as fornecedoras. 

Assim, por mais impopulares que sejam, as penalizações no grid devem ser vistas como um mal necessário.

Na verdade, elas existem na F1 há algum tempo. Nos últimos anos da era V8, o limite era de oito por temporada, com o uso de um nono gerando a penalização. Mas a regra era raramente aplicada.

Na verdade, os únicos pilotos que chegaram a isso foram Felipe Massa (Singapura, 2010), Rubens Barrichello (Abu Dhabi, 2011) e Charles Pic (Coréia, 2012). Em 2013, último ano dos V8, ninguém chegou ao nono motor. 

Quando o regulamento dos motores turbo-híbridos chegaram, em 2014, as restrições se mostraram bem mais complexas, com as unidades de potência sendo divididas nos seis elementos que conhecemos hoje, e um limite inicial de cinco por ano.

Apesar da imaturidade da tecnologia e problemas iniciais de confiabilidade, em retrospecto, as montadoras fizeram um bom trabalho em seguir o limite naquele ano. 

O primeiro a ser penalizado sob o novo regulamento foi Daniil Kvyat, cuja Toro Rosso precisou de um sexto motor Renault no GP da Itália. Na sequência, Pastor Maldonado, Jean-Éric Vergne, Romain Grosjean, Sebastian Vettel e Kvyat (novamente) foram penalizados até o fim do ano, sendo todos carros com unidades Renault.

Duas coisas aconteceram na segunda temporada da era híbrida: a redução do limite para quatro e a chegada da Honda com a McLaren, trazendo uma unidade de potência de confiabilidade pífia, além da montadora japonesa chegar com uma filosofia de mudanças regulares estratégicas para testar novos desenvolvimentos.

Enquanto tivemos apenas seis quebras de regulamento no grid em 2014, esse número subiu para 37 em 2014. No final daquele ano, a dupla da McLaren, Fernando Alonso e Jenson Button, haviam atingido a marca de 12 unidades de um mesmo elemento. No México, o espanhol recebeu uma punição que, somada, chegou a 55 posições no grid.

Uma temporada mais longa, em 2016, com 21 corridas, aumentou novamente o limite para cinco, reduzindo o número de penalizações. Em 2017, voltou para quatro, junto de um aumento nas punições. Mas em 2018 o regulamento foi reduzido ainda mais, para três V6s e MGU-H e apenas dois MGU-K, armazenamento de energia e controle eletrônico.

Valtteri Bottas, Mercedes W12

Valtteri Bottas, Mercedes W12

Photo by: Steven Tee / Motorsport Images

Agora, no oitavo ano da era híbrida, as montadoras seguem buscando os limites, e chegar ao fim de uma temporada de 22 corridas mostra-se nada fácil, especialmente se você for a Mercedes, com problemas de confiabilidade surgindo. Dos oito pilotos que usam motores da montadora alemã, apenas Lando Norris e Lance Stroll ainda não foram penalizados em 2021.

O sistema continua a frustrar os fãs e competidores, mas o problema é que ninguém criou uma alternativa factível.

"Acho que o sistema de penalizações por unidades de potência é bem robusto", diz Toto Wolff. "Porque o que precisamos é evitar a construção de motores de modo que eles tenham um pico de performance que dure apenas algumas corridas".

"E se você mudar o regulamento e dizer, ok, não há penalização para o piloto, apenas para os pontos de construtores, isso significará que, se você tiver um piloto lutando pelo campeonato, você vai jogar motor atrás de motor no carro".

"Acho que se tivermos uma boa solução, vale a pena dar uma olhada. É confuso para os novos fãs porque, sem ser responsabilidade do piloto, uma troca de motor o coloca no fundo do grid, ou cinco, dez posições mais atrás. Claramente isso não é bom, mas não temos soluções".

Uma anomalia no sistema é que as penalizações se tornam menos duras a partir do momento que você passa da quarta unidade.

Se a troca de um componente pela sua quarta unidade lhe causa uma punição de dez posições, se você chegar à quinta, sexta, isso cai para cinco posições, como visto com Valtteri Bottas ao colocar seu sexto motor de combustão interna em Austin.

Esse aspecto do regulamento surgiu no auge dos sofrimentos da Honda, como modo de minimizar seus problemas de confiabilidade, que pareciam não ter fim. Mas isso pode ser usado estrategicamente agora, introduzindo um V6 novo no fim do ano com um 'custo' relativamente baixo, enquanto os rivais tentam levar adiante a vida útil dos motores que já perderam rendimento.

"Acho que isso é uma legislação antiga por causa da Honda", diz Wolff. "Quando você está em uma situação em que tudo está indo terrivelmente ruim e você precisa trocar partes do motor ou unidades de potência completa você não deveria largar todas as corridas no fundo do grid ou perder 10 posições".

"Então é quase como um regulamento 'anti-vergonha'. E acho que isso seja ok, mas obviamente precisamos olhar para como fazer isso no futuro. Isso tem sido importante neste ano".

Andreas Seidl, chefe da McLaren, concorda que o sistema atual mantém um modo lógico de controlar desenvolvimento e performance.

"Obviamente entendo o ponto de não ser ideal termos tantas punições. Mas, para ser honesto, não vejo uma solução simples. Porque, por exemplo, se você decidir aumentar de três para quatro, vamos terminar com cinco motores, porque vamos levar ao limite".

"No final, isso apenas mostra que todas as equipes e montadoras estão levando ao limite com tamanha força que acaba criando problemas. Simplesmente precisamos aceitar isso e seguir em frente".

Marcin Budkowski, diretor executivo da Alpine, admite que as montadoras podem lidar com o sistema, mas que isso não faz sentido.

"No fim do dia, você acaba projetando um motor para operar de certo modo por uma certa quilometragem. Nada te impede no regulamento de projetar uma unidade que faça três corridas, mudando a cada três e tomando várias penalizações".

"Provavelmente não seria vantajoso pensando no campeonato. O regulamento existe obviamente por motivos financeiros, mas nada te impede de projetar um motor de vida útil menor e com mais performance, se você estiver disposto a tomar penalizações".

Budkowski traz uma perspectiva interessante, tendo passado um período breve trabalhando com a FIA, onde teve chance de estudar alternativas.

Marcin Budkowski, Executive Director, Alpine F1

Marcin Budkowski, Executive Director, Alpine F1

Photo by: Charles Coates / Motorsport Images

"Algumas pessoas odeiam essas penalizações. Até hoje não encontrei alguém que seja fã. Mas tendo vivido o outro lado, com a FIA, eu pensei em uma alternativa por anos, algo que seria melhor que a atual, mas não encontrei. Então não significa que não exista uma, mas que esse hoje é a alternativa menos pior".

"Agora, se tivéssemos quatro e três em vez de três e duas, talvez veríamos menos penalizações, mas, igualmente, as pessoas projetariam motores correndo mais riscos, e isso não levaria a usar um quinto? Seria uma história sem fim".

"Você precisa determinar o limite em algum momento. É possível argumentar que quatro e três seria melhor para uma temporada, porque veríamos menos penalizações. É um debate que precisamos ter na Comissão da F1 para ver qual direção tomar? Hoje, aumentar o número de motores significa aumentar os custos para todos".

Michael Masi, diretor de provas da FIA, é um dos envolvidos na formulação do regulamento desportivo, que determina as penalizações, e insiste que não houve um debate formal sobre alternativas.

"Não, nunca existiu. Cada equipe corre com o mesmo regulamento e sabe desde o início do ano quantas unidades de potência, caixas de câmbio e outros recursos poderá usar".

"Cada uma está no mesmo nível de compreensão sobre o que precisam fazer. Qualquer equipe, particularmente as envolvidas na luta pelo título, mas qualquer uma tentará tirar o máximo de vantagem competitiva com atualizações da unidade de potência, aerodinâmica, o que quer que seja".

Penalizações no grid de largada claramente não são um sistema ideal, e serão ainda menos popular se esse cenário acontecer, e uma punição tiver um papel fundamental para que Hamilton e Verstappen percam o título de 2021.

Mas até que alguém surja com uma alternativa funcional, que lide com os principais pontos de custo dos componentes, mantendo um limite sensível no desenvolvimento, a F1 está presa com elas.

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