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F1: Mais de 10 anos depois, da Matta revela último capítulo de 'treta' com projetista da Toyota

Após desentendimento com engenheiro na Fórmula 1, piloto brasileiro recebeu pedido desculpas da montadora

Cristiano da Matta

Piloto da Toyota na Fórmula 1 entre 2003 e 2004, Cristiano da Matta era uma das esperanças do Brasil na categoria, mas não teve sorte na equipe japonesa. Muito disso se deveu ao conturbado relacionamento com Mike Gascoyne, que projetou o último carro do brasileiro na elite da F1.

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Em entrevista exclusiva ao Motorsport.com via live de Instagram, da Matta revelou que, anos depois de ter sido dispensado em função do conflito com o engenheiro britânico, o time enviou um emissário para pedir desculpas em nome da montadora nipônica.

"Eles deviam ter te escutado a respeito das coisas que o Mike Gascoyne pediu para testar, testou e deram errado. A Toyota me pediu para vir aqui só para eu te dizer isso", disse o mensageiro. A história exclusiva você confere no vídeo abaixo:

Amizade com Rubinho

"No ano de 2004, no primeiro dia de testes do carro de 2004, eu lembrei de uma coisa... Sou muito amigo do Rubinho [Barrichello]. Na [minha] época de Fórmula 3000, na Inglaterra, eu morava na mesma casa que o Rubinho quando ele corria de Jordan. Eu morava na mesma casa que o Rubinho, então eu sou amigo dele. E eu lembro que nesse ano de F1 (1996), o Rubinho uma vez me contou um caso."

"Ele me falou assim: 'Cara, sabe de uma coisa que é interessante e é uma das coisas mais legais que você vai ter de experiência? Você vai lá em Paul Ricard, que é a pista sede da Toyota. Você passa lá o ano inteiro virando 1min02s0. Quando está tudo perfeito, 1min01s9. E aí você vai ver a coisa mais legal do planeta...'."

Da Matta seguiu relatando a fala de Rubinho: "'Quando você chega lá e entra no carro novo, na primeira saída que você faz aquecendo, para ver como é que está tudo, se está tudo funcionando, você já vira 1min01s9. É aquele [tempo] que você passou o ano (anterior) inteiro e só na situação 'ultra', final de tarde, pista fresquinha, vento a favor, etc, pneu zero, pouco combustível, para conseguir virar 1min01s9. Quando você colocar o carro do ano seguinte na pista, você sai, dá cinco voltas e já virou 1min01s9. Você vai ver, é a coisa mais legal do mundo'."

"Aí eu lembro que, indo para Paul Ricard em 2004 testar o carro de 2004, eu pensando nisso: 'Bom, o Rubinho falou aquele negócio, acho que a experiência vai ser legal, né...'. Imagina, chegar lá, aquecendo o carro, e virar 1min01s9 em Paul Ricard vai ser legal demais."

Panis, da Matta e a frustração

"No primeiro dia de treino, lógico que era o [Olivier] Panis guiando, o cara com 10 de temporadas de F1. Ele guiando assim o tempo nada demais. E o Olivier era um cara que eu era amigo, que eu conversava de tudo, a gente trocava ideia de tudo, falava de tudo... Obviamente, seu companheiro de equipe, na F1, é o seu maior rival, mas a gente se respeitava e obviamente se ajudava dentro do possível, até não te atrapalhar demais".

"Mas a gente era companheiro de equipe e a gente tinha o objetivo maior de levar o carro para frente do que só um 'dar pau' no outro, vamos dizer assim. Então, nesse ponto, era bom. E eu, vendo ele treinando, pelo tom de voz dele com os engenheiros, olhando para a cara dele dentro do capacete, eu lá com o 'radinho' ouvindo ele falar, ele algumas poucas vezes, de cruzar o olho, eu lembro dele fazer um sinal meio negativo assim...".

"Depois do treino, fui lá e falei com ele e ele assim: 'Cara, não achei nada demais, viu? Parecia que eu estava andando no carro do ano passado. Muito parecido com o carro de 2003, não achei nada de legal'. Aí no dia seguinte foi a minha vez de testar. Obviamente, pelo que eu tinha visto do Olivier guiando no dia anterior, eu pensei assim: 'Aquela história do Rubinho acontece mais na Ferrari, né... Já na Toyota...'."

"Mas uma coisa aconteceu... O [Mike] Gascoyne, que fez o carro de 2004, quando ele foi contratado pela Toyota, o que foi mais ou menos em setembro ou outubro do ano anterior, ele começou a frequentar algumas corridas e ia na fábrica. E a gente tinha algum relacionamento com ele. O Gascoyne, pelo jeito que ele contava, que ele falava com a gente sobre o carro novo, as ideias dele e etc...".

'Toyota x Ferrari'

"Eu logicamente era novato na categoria, então quem sou eu para falar alguma coisa... Mas ele falava e contava aqueles casos para mim, e eu falava assim: 'Pô, esse cara sabe. Mas eu sou novato, vamos ver com o Olivier'. E ele: 'Esse cara aí, pelo papo dele, é bom o [Michael] Schumacher e o Rubinho ficarem espertos no ano que vem'. Lógico que não nesse tanto, mas eu falei: 'Pô, acho que ano que vem a gente vai estar bem, cara...'."

"Porque, pelo papo dele, era meio que ciência exata, o carro vai ser 'filé mignon', coisa nobre. E o cara realmente fez isso com toda a equipe. Só que, quando colocou o carro na pista para o Olivier guiar, o Olivier guiou e falou o que eu te disse: 'Bicho, parece o carro do ano passado, não mudou absolutamente nada'. Eu guiei no dia seguinte e falei assim: 'Bicho, não mudou absolutamente nada, né... O que que eu posso dizer desse carro?'."

"Não chegou a virar nem 1min01s9 que tinha virado no carro de 2003. Não chegou a virar nem aquilo, mas era o primeiro dia do carro e você, como piloto, como equipe e todo mundo, a gente quer sempre ver uma janela ali de melhora, então quer ver uma oportunidade para que melhore tudo aquilo que você está fazendo. Aí fomos para a primeira corrida, lá na Austrália, em que, no primeiro ano (2003), eu e o Olivier tínhamos classificado perto lá da 'cozinha'."

Mais um carro...

"Na segunda corrida, que foi Malásia, em que a gente tinha classificado, mais ou menos, se não me engano, em 10º, nono, alguma coisa assim, em 2003, a gente foi lá para a cozinha também (em 2004). Aí, depois da Malásia, o Gascoyne falou para mim, para o Olivier e para todo mundo da equipe: 'Oh, esse carro aqui tem uma coisa 'assim e assim e assim' e não está dando certo por 'isso'. Mas, agora, no começo da temporada europeia, a gente vai ter um carro novo'."

"Tinha um espaço de um mês, um mês e meio, não me lembro exatamente, mas tinha um espaço um pouco maior da Malásia para Ímola, e a gente ia ter um carro todo novo. E com o papo dele: 'Agora vai funcionar'. E, logicamente, com o fracasso que tinha sido o primeiro carro, eu falei: 'Bicho, acho que vai mesmo'. Porque você 'se engana' também. Você não entende tão especificamente da parte física e aerodinâmica para saber exatamente o que pode ser".

"Aí fomos lá para Ímola e andamos. Na classificação, eu me lembro que consegui dar uma volta muito boa, fora do que eu estava acostumado conseguir. Consegui fazer uma classificação muito acima do que o carro seria capaz. Como piloto, você sempre pensa: 'Mandei bem. O carro foi legal, mas a minha volta...'. Foi tipo assim, no último setor da pista, eu lembro que eu tinha sido do top-5, top-6", relembra da Matta.

"O pneu grudou mais ou menos o que eu achei que iria grudar, mas, para a corrida, o meu desempenho nos outros setores era tudo lá para trás, o que era o normal. Era mais ou menos onde o Olivier tinha largado também. Então teve essa 'despistada' que deu nessa classificação de Ímola, mas, com o carro todo novo e etc, não funcionou nada também", disse o brasileiro, antes de relatar outro 'migué' do engenheiro britânico.

As justificativas de Gascoyne

"Passou Ímola e o Gascoyne veio com outro papo: 'Ah, porque aquela asa dianteira e aquele negócio assim e assim e assim...'. Aí fez outra suspensão dianteira, testou e não mudou nada. Aí depois fez outra, vinha sempre com alguma coisa de alguma peça que seria a solução, mas não mudava nada. Aí eu lembro que, em um belo dia, eu pensei, meio 'burro', meio sem noção: 'Cara, estou trabalhando aqui para a Toyota. Quero que a Toyota vá bem, então tenho que deixar claro para a Toyota o que funciona, o que não funciona'."

"Lá em Colônia (na Alemanha, sede da equipe), eram 700 caras trabalhando na fábrica para colocar dois carros de corrida na pista, fazendo motor, chassi, túnel de vento, tudo, do primeiro parafuso até a última arruela de todas as peças do carro. Então eu pensava assim: 'Cara, eu sou o cara que, por mais simulação e teste que tenha, eu tenho que falar para a Toyota tudo o que eu estou achando bom e ruim, onde pode melhorar, onde não pode...'."

"Eu pensei assim: 'Cara, é minha equipe, então eu tenho que falar com os caras'. Fiz a coisa que, na minha cabeça caipira, pode chamar do que for, mas que na minha cabeça era o certo, que era do jeito que funcionava na Newman-Haas, por exemplo, em que eu tinha tido uma experiência excelente. Tem que ser tudo claro, não pode ter entrelinhas, não pode ter névoa, tem que ser preto no branco".

"Pensei: 'Estou aqui com a Toyota e o Gascoyne já fez dois carros'. Lá pela sexta etapa, pensei assim: 'Tenho que falar com o pessoal da Toyota'. Comecei a falar assim com os engenheiros: 'Gente, olha só: o cara fez o carro e o resultado vocês viram. Fez outro carro inteiro, quer dizer, dois projetos, imagina o custo. Tudo dá errado. Tudo que ele fez, nada foi para frente'. Então comecei a falar isso para o pessoal da Toyota."

Engenheiro x pilotos

"E o que deve ter acontecido... A notícia que eu li, antes dele entrar, era que a Toyota ia contratar o Gascoyne por coisa alta. Então, obviamente, o cara estava ali fazendo o comercial dele, né? Se não a aposentadoria também, para dizer a verdade... E o cara deve ter começado lá dentro assim: 'Mas esse Cristiano também, né... Esses caras que vêm dos EUA, ninguém acelera nada. E o Panis está velho também, imagina... da Matta e Panis? Pára, né... Quer que a gente faça mágica?'."

"Deve ter sido alguma coisa assim. Pelo procedimento e pelo resultado de tudo, foi isso que aconteceu, eu acho", analisou da Matta, antes de ser questionado sobre se houve um atrito direto com Gascoyne.

O brasileiro respondeu: "Nada direto. Eu falava com ele assim: 'Oh, Mike, não funcionou aqui e aqui. Não senti diferença nenhuma. Olha lá na telemetria direito porque eu não senti nada e o tempo não mostrou nada. Não consegui aproveitar nada disso'. Se você conhecê-lo, ele é o cara mais 'de boa' do planeta. E o papo dele, imagina... Ele me levar no papo novato... Mas, imagina, ele levou o Olivier Panis no papo."

O pedido de desculpas

"Voltei em 2005 para os EUA. Em 2006, na corrida de Long Beach, eu lá no paddock, vejo um 'japonezinho' da Toyota lá. E a Toyota é lá perto de Long Beach. Eu falei assim: 'Pô, o cara da Toyota está aqui, mas a Toyota não patrocina mais, na corrida a Toyota não faz mais nada, o que que esse cara da Toyota está fazendo aqui?'. Eu vi o cara lá, 'não olhei' para o cara. O cara passou e depois chegou para mim: 'da Matta-san?'. Eu: 'Sou'. Eu logicamente conhecia a grande maioria dos caras da Toyota, mas aquele cara especificamente eu não conhecia."

"O cara: 'da Matta-san, eu estou aqui em nome da Toyota. A Toyota me pediu para vir aqui só para te falar uma coisa'. Eu falei assim: 'Pois não'. Ele: 'A Toyota me pediu para vir aqui falar que você estava certo, que eles deviam ter te escutado a respeito das coisas que o Mike Gascoyne pediu para testar, testou e deram errado. A Toyota me pediu para vir aqui só para eu te dizer isso'."

"Eu falei assim: 'Oh, muito obrigado, fico agradecido pela Toyota. Um pouco tarde demais para o meu lado, não valeu muito a pena, mas eu agradeço e eu fico satisfeito por vocês me dizerem isso, porque eu sei que o que eu falei não era balela'. Ele falou desculpas, inclusive: 'Desculpa por isso, levou um longo tempo para ver que você estava dizendo as coisas corretas'. E eu: 'Isso, para mim, como um esportista que eu sou, é um negócio que eu acho legal, que me faz bem'."

"É um pessoal com quem eu trabalhei por tanto tempo e com quem eu fiz tanta coisa, com quem eu consegui ganhar tanta coisa. Me falar uma coisa dessa é muito legal, né...", completou da Matta, que foi campeão da CART em 2002 e da Indy Lights em 1998.

Cristiano da Matta e cia: relembre todos os pilotos brasileiros da história da Fórmula 1

Chico Landi - de 1951 a 1956 - 6 corridas
Gino Bianco - 1952 - 4 corridas
Hermano da Silva Ramos - 1956 e 1957 - 7 corridas
Fritz d'Orey (#40) - 1959 - 3 corridas
Emerson Fittipaldi - de 1970 a 1980 - 144 corridas, 2 títulos (1972-1974) e 14 vitórias
Wilson Fittipaldi - de 1972 a 1975 - 35 corridas
José Carlos Pace - de 1972 a 1977 - 72 corridas - 1 vitória
Luiz Pereira Bueno - 1973 - 1 corrida
Ingo Hoffmann - 1976 e 1977 - 3 corridas
Alex Dias Ribeiro - de 1976 a 1979 - 10 corridas
Nelson Piquet - de 1978 a 1991 - 204 corridas, 3 títulos (1981, 1983 e 1987), 23 vitórias
Chico Serra - de 1981 a 1983 - 18 corridas
Raul Boesel - de 1982 a 1983 - 23 corridas
Roberto Moreno - de 1982 a 1995 - 42  corridas
Ayrton Senna - de 1984 a 1994 - 3 títulos (1988, 1990 e 1991) 161 corridas, 41 vitórias
Mauricio Gugelmin - de 1988 a 1992 - 74 corridas
Christian Fittipaldi - de 1992 a 1994 - 40 corridas
Rubens Barrichello - de 1993 a 2011 - 324 corridas - 11 vitórias
Pedro Paulo Diniz - de 1995 a 2000 - 98 corridas
Ricardo Rosset - de 1996 a 1998 - 26 corridas
Tarso Marques - de 1996 a 2001 - 24 corridas
Ricardo Zonta - de 1999 a 2005 - 36 corridas
Luciano Burti - 2000 e 2001 - 15 corridas
Enrique Bernoldi - de 2001 a 2002 - 28 corridas
Felipe Massa - de 2002 a 2017 - 269 vitórias - 11 vitórias
Cristiano da Matta - 2003 e 2004 - 28 corridas
Antonio Pizzonia - de 2003 a 2005 - 20 corridas
Nelsinho Piquet - 2008 e 2009 - 28 corridas
Bruno Senna - de 2010 a 2012 - 46 corridas
Lucas di Grassi - 2010 - 18 corridas
Felipe Nasr - 2015 e 2016 - 39 corridas
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PODCAST Motorsport.com entrevista Felipe Massa, contemporâneo de da Matta na F1

 

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