Cheia de histórias, 'Família da Poeira' busca glória no Rally dos Sertões
Encabeçado por Reinaldo Varela, clã vai em busca de novas conquistas na edição de 2019 do rali mais importante do Brasil
A edição de 2019 do Rally dos Sertões está prestes a começar. O maior rali de velocidade da América do Sul terá sua largada oficial no próximo sábado, em Campo Grande (MS), e os holofotes já estão sobre os principais concorrentes da disputa.
Falando em títulos, é impossível não pensar na 'Família da Poeira', do pai Reinaldo Varela, vencedor do Rally Dakar em 2018 entre os UTVs, e seus filhos Rodrigo, Gabriel e Bruno (veja os pilotos em ação em galeria especial no fim da matéria). Multicampeão, o clã quer mais conquistas.
Aos 60 anos, Reinaldo acumula mais de três décadas de experiência off-road. Além da glória no Dakar, o paulista é bicampeão mundial de Rally Cross Country e está perto de conquistar o tri: ele e o navegador Gustavo Gugelmin precisam de apenas dois pontos na etapa do Marrocos.
No Rally dos Sertões, Reinaldo soma dois títulos na Geral. Com mais de 360 largadas e 120 vitórias na carreira, o patriarca quer mais. E a preparação para a competição brasileira segue a todo vapor: "Estamos preparando tudo, mas é uma correria. Nós temos que nos dividir, cada um faz uma parte. O Bruno cuida da oficina, o Gabriel da burocracia e o Rodrigo do marketing. Eu coordeno e minha esposa cuida da logística de alimentação e nos acompanha no evento".
E nem a história de amor entre Reinaldo e Nani escapou dos ralis, como conta o piloto: "Eu tinha acabado de vencer em Gramado (RS), em 1985, ela estava lá e a gente se conheceu. Eu estava tirando uma fotografia e ela apareceu. A Nani sempre gostou de rali, sempre acompanhou, e os filhos também. Eles foram criados no meio, então foi fácil de eles seguirem a carreira".
A matriarca corrobora o depoimento sobre o primeiro 'encontro'. "Ele ganhou e duas meninas foram tirar foto com ele na frente da Igreja. A máquina não bateu a foto e o pessoal começou a falar que eu estava paquerando ele. Ali o romance começou, mas começamos a namorar depois. A gente conversava a distância e eu já estava querendo casar. Graças a Deus, deu certo", relembra.
Os bebês Varela e as corridas
"Desde que eram bebês, eu sempre os levei para os ralis. Nunca deixei de ir em uma corrida. Mas eu não imaginava que os três iriam correr. Pra mim, foi uma surpresa, por mais que eu estivesse com eles nas provas", comenta Nani.
"Aí um foi para moto, o que eu não gostei, foi o pior pra mim. Era o que eu tinha a maior insegurança, qualquer acidente poderia ser fatal. Quando veio o UTV, eu nasci de volta, porque pude ter os quatro no UTV, minha maior realização como mãe. Eles amam e eu também. Não tenho palavras para agradecer esse UTV [utility task vehicle, ou veículo utilitário multitarefas, em inglês]".
Nas competições, o UTV é um intermediário entre um carro e um quadriciclo. Base e motorização são muito semelhantes ao quadriciclo, mas o UTV tem a ‘gaiola’, proteção tubular em torno do cockpit. Isso permite que o UTV leve dois passageiros lado a lado. No caso, piloto e navegador.
"Não dá mais tempo de passear"
Apesar da satisfação de ter os filhos e o marido nas corridas, Nani conta que o esforço é grande: "É muito trabalho, mas é bom porque estou acompanhando a minha família. A nossa equipe cresceu muito. Quando era só o Reinaldo, era mais simples e eu também ia passear. Hoje, eu vou e trabalho muito, porque todos competem muito forte, não dá mais tempo de passear".
A situação é diferente do começo da carreira de Reinaldo, que precisava se virar para disputar os ralis; "Eu não tinha condições, então corria com um Voyage emprestado pelo meu primo. Pegava o carro na sexta com o meu primo e arrumava tudo para poder correr no sábado", explicou.
"No domingo, eu tinha que devolver o carro para o dono trabalhar, então não podia acontecer nada de errado. E foi o que eu fiz durante muitos anos, porque eu não tinha condições de ter um carro naquela época".
A rivalidade na família
Foi o princípio de uma trajetória que se estende aos filhos. O caçula, Bruno, campeão do Rally dos Sertões em 2017, fala do prazer de correr com o pai e os irmãos. "A sensação é boa. Somos da mesma família, mas todo mundo concorrente".
"Lógico que a gente se ajuda se for preciso e estiver ao alcance, mas todos vão tentar ganhar, então a gente se ajuda só até um certo ponto. Mas somos uma família e o que dá para ajudar a gente faz, para que todos possam se sair bem".
Bruno também revela a intimidade dos Varela: "A gente faz brincadeiras, mas é saudável e o irmão mais novo tem que ganhar sempre, no caso eu. Como ganhei o Sertões, tiro um sarro dos mais velhos, mas é normal. A gente nasceu na poeira, nos Sertões. É muito legal ter a família junta".
Reinaldo corrobora o depoimento do caçula: "Além de irmãos, são competidores. Cada um por si e não tem moleza. Lógico, depois que acontece alguma coisa com alguém, quem sai fora passa a ajudar os outros. Isso é uma regra nossa".
"Quando sai fora, passa a ajudar os outros. Os três títulos que eles tiveram foram graças ao trabalho da equipe. Senão, não teriam conseguido. O Gabriel, quando foi campeão da categoria faz uns três anos, teve um problema no último dia faltando uns 50km, aí o Rodrigo puxou ele pelos 50km. O que manda é o trabalho da equipe", crava o patriarca, que também disse que competir com os filhos "estava escrito que iria acontecer".
O que eles mais querem é ganhar do pai
A matriarca, porém, não encara o assunto com tanta naturalidade. "Já era para eu ter me acostumado depois de tantos anos, mas sempre dá um frio na barriga. Cada um tem sua independência e quer ganhar", conta Nani.
"O que eles mais querem é ganhar do pai. E o Reinaldo tem um medinho de eles ganharem, então fico ainda mais quieta. Tenho que colocar os panos quentes, porque uma hora vai acontecer. Tem muita provocação, mas essa parte eu acho gostosa, porque tem uma troca muito boa".
O medo, o brinco perdido e a recompensa
A mãe também confessa que já teve receio de os filhos correrem. E ela conta uma história que mistura perigo e diversão: "Eu tinha medo. Corri com o Gabriel uma vez e aconteceu de tudo. Pensa numa prova que teve todas as temperaturas. Largamos com um calor enorme, pegamos chuva e ele bateu no fim. Ele também ficou nervoso em pilotar comigo. E como navegadora, minha experiência não foi boa, dá muito trabalho. Não é minha praia, prefiro pilotar".
"Eu fui com brinco para aquela corrida e perdi ele no final do rali. Paguei uma recompensa fantástica para os mecânicos e eles encontraram. Comecei dando 200 reais para cada se eles achassem. No final, eu não estava mais acreditando, então subi para 500. Então o brinco apareceu no meio de uma lama que você não tem noção. Eles salvaram meu brinco na última tentativa. Foi uma história inédita. Essa eu devo à equipe, que é só completa quando todos trabalham juntos".
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