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Análise: Quando a complexidade dos carros foi tão longe?

A enorme complexidade dos carros de corrida modernos das principais categorias do esporte a motor ameaça a qualidade das corridas? Charles Bradley, editor-chefe do Motorsport.com, analisa

Rosberg's steering wheel

Foto de: Giorgio Piola

Ouvir um piloto profissional reconhecer que "há comandos no volante que nem o piloto sabe para que servem" e que "às vezes, o que você quer é apenas pilotar" faz você parar para pensar se a complexidade do esporte a motor moderno não foi longe demais.

Então quando Anthony Davidson, campeão do Mundial de Endurance em 2014 e ex-piloto de Fórmula 1, diz que "não há dúvida" de que os carros são muito complexos, você precisa parar e concluir que o esporte tomou um caminho errado.

Red Bull using the F-Duct system
Sistema F-Duct da Red Bull

Foto: XPB Images

A última vez em que tive um sentimento tão forte sobre algo errado nos cockpits foi durante a era dos f-ducts na F1 - quando o piloto conseguia mudar a inclinação da asa traseira utilizando o cotovelo ou o joelho para mudar o caminho do fluxo de ar e direcioná-lo para a asa traseira.

Ver os pilotos contornando a Eau Rouge apenas com uma das mãos no volante era aterrorizante e, embora fosse uma simples ideia de engenharia - eu gosto de ver inovações técnicas no esporte - fiquei aliviado quando voltaram atrás e proibiram o conceito.

Era mais um elemento para se pensar e prestar atenção em meio ao calor da batalha, quando certamente gostaríamos de ver nossos 'gladiadores' totalmente focados em, bom, pilotar o carro e disputar posição com os adversários em vez de lidar com botões e mais botões.

Mas agora parece que os pilotos estão sendo direcionados para as distrações dos complexos volantes atuais.

“São muito complicados e o que acontece: tudo o que você quer é pilotar, mas então você é orientado a colocar a regulagem de algo na posição certa e depois apertar 'mais' ou 'menos' para chegar ao número certo... e o botão de regulagem tem 15 posições", disse Davidson ao Motorsport.com.

“Receber o pedido para tais mudanças duas ou três vezes por volta... no WEC isso ainda pode ser controlado. Geralmente é em condições adversas ou se algo fora do normal acontece é que você mexe nestes comandos", afirmou.

Tanta tecnologia vale realmente a pena? 

Juan Pablo Montoya, Porsche Team Porsche 919 Hybrid
Juan Pablo Montoya, Porsche Team Porsche 919 Hybrid

Foto: Porsche AG

Falei com Juan Pablo Montoya após ele ter testado o 919 Hybrid no teste pós-temporada do WEC e perguntei a ele sobre as primeiras impressões do carro.

"Fiquei chocado quando eles me deram um manual de 30 páginas que ensinava como pilotar o carro! Mesmo quando estive na McLaren eram apenas alguns botões no volante, todos com letras abaixo. Você só precisava qual função cada letra significava", disse. 

Porsche 919 Hybrid steering wheel
Volante do Porsche 919 Hybrid

Photo by: Giovanni Pagani

Desde o tempo em que Montoya estava na F1, parece que os avanços na tecnologia híbrida, junto com sensores e regulagens em quantidade nunca vista antes e que complicam ainda mais av vida do piloto no cockpit.

“Quando a Toyota voltou à LMP1 em 2012, ano de criação do WEC, a fabricante tomou como base o volante do último modelo de F1 do time japonês, o que mostra a proximidade entre as categorias", acrescentou Davidson. “Utilizamos o mesmo software MES da F1, então temos o mesmo display e conseguimos fazer as mesmas coisas."

“Há uma linguagem comum entre a F1 e o WEC. Os modos de configuração que eles usam lá nós também usamos aqui. Existe uma infinidade de modos e é impossível decorar todos - você tem 15 modos padrão e mais 15 sub-modos em cada modo", observou.

“ISão basicamente sensores, mas você pode desligar as câmeras do WEC, ligar ou desligar os sons de aviso de rádio - você pode fazer um monte de coisas! Por que os pilotos precisam saber tudo isso? Além disso, há comandos no volante que os pilotos nem sabem para que servem", apontou.

Conclusão

Nico Rosberg, Mercedes AMG F1 W07 Hybrid leads team mate Lewis Hamilton, Mercedes AMG F1 W07 Hybrid at the start of the race
Nico Rosberg lidera na largada do GP da Espanha de 2016

Foto: Mercedes AMG

A questão que surge logo de cara é sobre a necessidade de tamanha complexidade. Meu velo amigo Ian Harrison, ex-integrante da Williams, chamaria isso de "exibicionismo de engenharia".

Stefan Johansson, ex-piloto de F1, abordou o tema recentemente e disse: "se você permite que os projetistas criem carros tão complexos a ponto de você ter que dizer aos pilotos como eles devem pilotar durante a corrida, você precisa voltar ao básico - e rápido!", afirmou.

“O que nós temos agora, e tenho dito isso o tempo todo, é engenharia pornográfica. Simples assim. Se nem os pilotos entendem metade disso, por que o público deveria?", acrescentou.

Quando analisamos a temporada 2016 da F1, um momento que se destaca neste sentido é o incidente entre Nico Rosberg e Lewis Hamilton em Barcelona. 

Qual a origem do incidente? Rosberg selecionou o modo errado para o motor naquele momento, o que fez o carro dele perder velocidade em relação ao de Hamilton repentinamente. É necessário questionar o que eles querem alcançar aqui: um campeão mundial ou alguém que seja preciso ao gerenciar botões?

Entrevista com Anthony Davidson por Jamie Klein

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