MotoGP - Desconfiança, segredos e sucesso: Conheça a história da ida de Rossi para a Yamaha em 2004
Valentino Rossi estava no seu apogeu com a Honda em 2003, e poucos apostariam nele se juntando a uma Yamaha que sofria. Mas ele acabou fazendo isso, graças aos esforços do chefe Davide Brivio, resultando no capítulo de maior sucesso de Rossi na MotoGP
A história do esporte a motor é cheia de trocas icônicas que criaram dúvidas no momento em que aconteceram mas que, no final, se mostraram grandes golpes. A ida de Michael Schumacher para a Ferrari em 1996 quando a equipe italiana vivia uma seca de 15 anos e a de Lewis Hamilton, trocando a McLaren por uma ainda inconsistente Mercedes em 2013, um ano antes da mudança para os motores híbridos que o colocou entre as lendas da Fórmula 1, são alguns exemplos.
O equivalente no mundo das motos veio em 2003, quando a Yamaha conseguiu convencer Valentino Rossi, então na Honda, a se juntar à montadora para a temporada 2004 da MotoGP. A história mostra o brilhantismo da parceria do Doutor com a marca japonesa: 16 temporadas em duas fases (2004 a 2010 e 2013 a 2021), com quatro títulos mundiais para o italiano e 56 vitórias.
Mas, naquele momento, a manobra foi vista como extremamente arriscada para Rossi, que já era um tricampeão mundial na categoria rainha. Ele venceu o último título das 500cc em 2001 e os dois primeiros da MotoGP em anos consecutivos com a dominante RC211V.
Em contraste, a Yamaha não vencia um título na MotoGP desde o terceiro e último de Wayne Rainey nas 500cc em 1992. Na era MotoGP, a Yamaha tinha um ritmo que deixava a desejar. Enquanto Rossi venceu 11 vezes em 2002, terminando todas as corridas em primeiro e segundo (exceto o abandono na República Tcheca), o melhor piloto da Yamaha, Max Biaggi, teve apenas duas vitórias, terminando com o vice, mas 140 pontos atrás do Doutor.
Em 2003, a Yamaha não venceu nenhuma corrida. O único pódio no ano veio graças à Alex Barros com a Tech3, então satélite da montadora. No campeonato, o melhor piloto da Yamaha foi Carlos Checa, em sétimo, 234 pontos atrás de Rossi, que venceu nove corridas no ano.
Mas a desilusão envolvia Rossi e a Honda, com a equipe tendo mais orgulho pela RC211V do que pelo sucesso que o piloto tinha, deixando o italiano com uma sensação de desvalorização. Isso abriu a porta para a Yamaha tentar conquistar a maior estrela do esporte.
Rossi and Honda were a dominant combination in 2003, but Brivio convinced him that his future lay with Yamaha
Photo by: Gold and Goose / Motorsport Images
A figura-chave para isso foi Davide Brivio, então chefe da equipe oficial da Yamaha. Sua primeira ligação com a marca veio no Mundial de Superbike em 1990, se juntando à equipe da MotoGP em 2001. Agora no centro do maior golpe da equipe, Brivio teve um problema, revelado recentemente em entrevista à edição espanhola do Motorsport.com.
"De primeira, a Yamaha não queria contratar Rossi", explicou Brivio, que hoje trabalha na F1 com a Alpine. "Havia uma tendência que dizia que, se ele vencesse, todo mundo acharia que seria mérito apenas dele. E se ele não vencesse, o foco estaria na moto".
"Quem mudou esse pensamento foi Masao Furusawa, que assumiu o programa em junho de 2003. Ele foi quem convenceu o presidente da Yamaha que deveriam trazer Valentino. Juntos, convencemos a direção que, para vencer, era essencial termos um piloto de ponta. A Honda vencia, sim, mas com os melhores: Mick Doohan, Rossi...".
O convencimento da direção da Yamaha foi fundamental para que a seca da montadora chegasse ao fim. Mas ainda era preciso fechar o acordo, e isso dependia de Brivio e Lin Jarvis.
"Nós abrimos a barraca, entramos, sentamos ao redor de uma mesa e iniciamos a reunião. De repente, ouvimos uma moto se aproximando, e eu e Lin nos escondemos embaixo da mesa" - Davide Brivio
O paddock da MotoGP é cheio de reuniões secretas que são farejadas pela mídia, mas o cortejo da Yamaha para Rossi foi incrivelmente coberto. Brivio revelou que as negociações com Rossi foram constantes nos fins de semana daquele ano, mas a distância que a direção da Yamaha teve que correr para manter os detalhes privados chegavam aos extremos, com um incidente em particular terminando com Brivio escondido embaixo de uma mesa...
"Durante a temporada de 2003, nos encontramos com Vale quase todo final de semana de corrida para falarmos de várias coisas: formação da equipe, quais mecânicos ele queria, como lidar com os testes e mais", disse Brivio. "O problema era onde nos encontrávamos, porque no paddock você está à vista de todos, e nos hotéis estamos todos juntos".
"Um dos episódios mais estranhos veio na Clínica Móvel, em Brno [República Tcheca]. Nos encontramos lá após as dez da noite, quando todos os fisioterapeutas e médicos já haviam ido embora. Nos abrimos a barraca, entramos, sentamos ao redor de uma mesa e iniciamos a reunião. De repente, ouvimos uma moto se aproximando, e eu e Lin nos escondemos embaixo de uma mesa".
Brivio, who later achieved success with Joan Mir and Suzuki in 2020, first had to convince the Yamaha hierarchy that it would get a share of the credit for Rossi's successes
Photo by: Gold and Goose / Motorsport Images
Gibo Badioli, então empresário de Rossi, fez demandas pesadas para a Yamaha para fechar o acordo. Segundo Brivio, suas solicitações financeiras eram "desproporcionais em um primeiro momento" segundo Brivio. Mas o acordo foi fechado e Rossi colocou o paddock em chamas com a notícia da ida para a Yamaha. Apesar do acordo ser público, a marca japonesa manteve as operações secretas com o italiano pelo resto do ano.
"Após fecharmos o acordo, chegou o momento em que Vale queria ver a moto. Foi em Donington Park. Esperamos até as primeiras horas da manhã, porque queríamos um paddock limpo. E ele veio com um capuz para não ser reconhecido".
A Honda não facilitou a saída de Rossi no fim de 2003, fazendo-o cumprir seu contrato até o último dia, impedindo que ele testasse a M1 até o ano seguinte. Mas tendo ao seu lado o chefe de sua equipe Jeremy Burgess, que ajudou Doohan na conquista dos cinco títulos das 500cc com a Honda entre 1994 e 1998, não havia nada que impedisse o aguardado retorno da Yamaha ao topo em 2004.
Após uma disputa intensa contra seu arquirrival Max Biaggi, agora na Honda, durante a etapa de abertura, na África do Sul, Rossi iniciou a trajetória com a Yamaha vencendo. Foi a primeira de nove vitórias que lhe rendeu o quarto título na categoria rainha. Ele venceria novamente em 2005 e depois em 2008 e 2009.
Após uma desastrosa passagem de dois anos com a Ducati em 2011 e 2012, Rossi voltou à Yamaha para 2013, vencendo mais 10 corridas e terminando como vice-campeão em três anos consecutivos, entre 2014 e 2016. O italiano ainda terminou sua carreira na MotoGP no ano passado como piloto da Yamaha, mas na satélite Petronas SRT.
Brivio teve mais sucesso na MotoGP com a Suzuki, se unindo à marca em 2013 antes de seu retorno à classe principal em 2015. Mas ele passou a utilizar uma tática diferente da que tinha na Yamaha, focando em jovens talentos, como Maverick Viñales, Álex Rins e Joan Mir, que foi campeão em 2020, encerrando uma seca de 20 anos da Suzuki.
Enquanto Rossi seja o lembrado como uma lenda da Yamaha, muito desse sucesso se deve à Brivio e todo seu esforço em 2003 para garantir o #46 como piloto da marca.
Rossi takes the chequered flag to the acclaim of his team at Sepang in 2004
Photo by: Gold and Goose / Motorsport Images
TELEMETRIA DE FÉRIAS (Parte 2): Rico Penteado aponta favoritos para 2022
Assine o canal do Motorsport.com no YouTube
Os melhores vídeos sobre esporte a motor estão no canal do Motorsport.com. Inscreva-se já, dê o like ('joinha') nos vídeos e ative as notificações para ficar por dentro de tudo o que rola em duas ou quatro rodas.
Podcast #158 – TELEMETRIA DE FÉRIAS: Rico Penteado explica novo carro da F1
ACOMPANHE NOSSO PODCAST:
Faça parte da comunidade Motorsport
Join the conversationCompartilhe ou salve este artigo
Principais comentários
Inscreva-se e acesse Motorsport.com com seu ad-blocker.
Da Fórmula 1 ao MotoGP relatamos diretamente do paddock porque amamos nosso esporte, assim como você. A fim de continuar entregando nosso jornalismo especializado, nosso site usa publicidade. Ainda assim, queremos dar a você a oportunidade de desfrutar de um site sem anúncios, e continuar usando seu bloqueador de anúncios.