Presidente da CBA rompe silêncio, admite erros e adota discurso conciliador com a Stock Car
Após polêmica por punições a Ricardo Zonta e Thiago Camilo, Waldner Bernardo assume falhas da confederação, mas pondera dificuldades
Em meio às polêmicas na Stock Car por causa de punições a Ricardo Zonta e Thiago Camilo - esta, aliás, teve mais um capítulo nesta sexta-feira, com liminar favorável ao piloto -, o presidente da Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) rompeu o silêncio. Em entrevista exclusiva ao Motorsport.com Brasil, Waldner Bernardo reconheceu falhas na comunicação da entidade e rebateu críticas do promotor da Stock, Carlos Col, que chamou a CBA de "amadora".
Dadai, como é conhecido, admitiu que seu departamento de comunicação errou na divulgação da punição a Zonta, mas apontou dificuldades em dar rapidez ao caso de Camilo. O mandatário também defendeu a confederação das críticas de Col, destacando que o quadro da CBA "é o melhor possível e, sim, profissional". Apesar do atrito, o presidente disse estar em sintonia com o chefe da Vicar, promotora da Stock: "Me dou super bem com o Col. A gente está no mesmo barco e rema junto".
Consultada pela reportagem sobre a liminar que suspende a punição a Camilo, veiculada nesta sexta, a Vicar disse que o assunto é de responsabilidade da CBA. Esta, por sua vez, respondeu o seguinte: "Informamos que recebemos a decisão e encaminhamos o documento para revisão de nosso departamento jurídico". Antes da notícia, o presidente da CBA falou ao Motorsport.com Brasil sobre as críticas feitas por Col ainda durante a etapa de Goiânia, em entrevista coletiva. Veja abaixo:
Divulgação da punição a Ricardo Zonta
Um dos pontos mais criticados, não só por Col, foi a maneira com a qual o gancho ao piloto da Shell V-Power foi comunicado. A CBA não oficializou a punição à Stock e informou pilotos e equipes durante reunião na quinta-feira, antes de repassar à Vicar. Além disso, o comunicado não trazia a classificação atualizada do campeonato e nem o motivo da desclassificação de Zonta da rodada dupla do Velo Città, em que o ex-Fórmula 1 ganhou uma das corridas.
"Houve uma falha da CBA no alinhamento da comunicação. Isso é fato. O regulamento da categoria prevê que o promotor tem que ser avisado. E aí ele faz a divulgação para a imprensa e a CBA faz para pilotos e equipes. Houve falha nessa divulgação e no formato com a qual foi feita. Estamos trabalhamos internamente para corrigir o processo", reconheceu Dadai.
"Não adianta querer contestar se a peça está dentro ou fora do regulamento, mas não podemos dizer que a gente não teve culpa na forma como foi comunicada a desclassificação. Houve uma da CBA, de alinhamento entre o quadro desportivo/técnico e o de comunicação, mas que internamente vamos corrigir", completou o presidente.
Ainda em Goiânia, Col criticou o processo: "Teve gente nos recriminando porque a gente não divulgou punição que não nos cabe divulgar. Quem tem que divulgar é a CBA. Cabe a ela tomar a decisão e divulgar. Inclusive está no regulamento. No momento em chega ao promotor, este tem o direito de divulgar aos demais. Foi o que fizemos no dia seguinte, quando recebemos a decisão comunicada oficialmente”.
“Mas veio incompleta, sem o motivo da punição e sem a nova tabela de classificação. E aí a gente é cobrado porque ‘o site oficial da categoria não está divulgando a nova classificação e nem porquê houve a punição’. Mas eu só posso divulgar o que a gente recebe formalmente, porque respeitamos o processo, o que talvez a CBA não esteja fazendo. O que custa fazer a informação completa e informar o promotor na hora certa?", questionou o chefe da Vicar.
Demora em noticiar a desclassificação
Além da comunicação incompleta, outro ponto polêmico foi a demora. A punição foi vazada na quinta-feira anterior à rodada dupla de Goiânia, realizada duas semanas após as atividades do Velo Città. Nesse ponto, Dadai defendeu a CBA e ponderou que há uma série de procedimentos a serem tomados em investigações do gênero. No caso em questão, a peça investigada foi a pinça de freios do carro de Zonta, que estaria fora do regulamento.
"Com relação a ter sido na quinta ou ter sido no briefing, é bom que se entenda como esses procedimentos funcionam. Uma vez que há uma irregularidade técnica que precisa de uma avaliação mais detalhada ou que a peça tenha de ser minuciosamente avaliada, ela é lacrada e é marcada a perícia, que pode ser feita por um terceiro, e definido o local em que acontecerá. E assim aconteceu com as pinças", disse Dadai.
"Então foi dada a maior celeridade possível ao processo. Mas o próprio código do automobilismo prevê que quando você lacra uma peça e é marcada uma vistoria técnica, você tem que fazê-la na presença dos componentes da equipe em questão e do corpo técnico da entidade. Óbvio que para juntar todas essas pessoas, que têm agenda, não é possível fazer logo na segunda ou na terça, até porque as equipes estão até se deslocando. Assim, do ponto de vista de timing, sinceramente não vejo qualquer problema, porque não tinha como ser mais rápido", completou o mandatário.
Já Col fez questão de diferenciar as funções entre a CBA e a organização da Stock Car, de modo que a categoria não seja criticada por coisas que não lhe competem: “É preciso entender a separação de áreas de atuação entre a Vicar e a CBA. E essas coisas são muito confundidas, inclusive às vezes pela própria imprensa. Falta a gente estar mais conhecedor das regras das coisas. A punição é do colegiado de comissários desportivos".
"O diretor de prova é o portador da decisão, o administrador da corrida, o gestor. Ele decide se vai ter safety car, bandeira amarela, branca, etc. Quem decide punição são os comissários desportivos, mesmo quando a origem é uma irregularidade técnica. Não é o comissário técnico que desclassifica. Ele apenas reporta o que encontrou aos comissários desportivos, que interpretam a informação à luz do regulamento da categoria e do código desportivo do automobilismo. Aí vão ver se cabe ou não algum tipo de punição, e qual gancho é cabível".
Col ainda corroborou os argumentos de Dadai em relação aos ritos anteriores à decisão do caso Zonta. "O processo foi lento, mas tem um motivo. A equipe impetrou um mandado de segurança para impedir o prosseguimento da vistoria e aí correu um prazo da justiça desportiva, que determinou que se ouvisse fulano e beltrano. E obviamente o órgão a tomar a decisão de punir não podia fazê-lo, porque tinha um mandado em julgamento”.
Caso de Camilo
O piloto da Ipiranga venceu a corrida 1 em Goiânia, mas os comissários decidiram punir Camilo com adição de 20s no tempo de prova em função de uma suposta queima de largada do pole position. Agora revista em caráter liminar, a decisão acabou demovendo o piloto para o meio do pelotão, retirando os pontos de seu triunfo. Entretanto, o gancho só foi divulgado após a corrida 2, em que as 10 primeiras posições do grid são invertidas conforme o resultado da primeira prova.
O presidente da CBA reconheceu que o erro afeta o espetáculo esportivo, mas defendeu a entidade: "A demora em se comunicar a punição causou todo um transtorno. Só que a gente tem que entender que o formato que a Stock adota hoje, de duas corridas com curto intervalo de tempo, muitas vezes não dá condição aos comissários de ter uma velocidade na divulgação de todos os resultados ou até de poder avaliar todas as situações".
"No caso, o Thiago até foi chamado e ouvido, e foram colhidas onboards de outros carros, tudo para avaliar bem a questão. Mas, claro, é ruim para o evento, porque se ele fosse punido na hora, haveria ali um reposicionamento de grid. O próprio Thiago poderia ter tentado se recuperar na corrida seguinte. Então não tem como você ser hipócrita e dizer que isso tudo não afeta e não abala. Isso prejudica o espetáculo como um todo".
Dadai ponderou também a carga de trabalho dos comissários: "Para se ter uma ideia, foram 11 protestos entre as quatro corridas da Stock Car e da Stock Light em Goiânia. Por isso que, muitas vezes, os comissários ficam avaliando onboards, fazendo as oitivas dos pilotos e todos os procedimentos para que se tenha a decisão mais justa possível".
"Não entro no mérito porque isso é de competência dos comissários, mas temos que trabalhar para tornar o processo mais rápido. Só que existem situações estruturais que muitas vezes não nos deixam ter essa celeridade. A gente costuma avaliar o caso como se fosse o único da corrida, mas tivemos 11 protestos a serem julgados pelos comissários. A televisão foca nos primeiros, é normal, mas existem situações do pelotão de trás que também precisam ser julgadas", completou.
Ainda assim, Col não poupou críticas ao "sistema". “Sem criticar as pessoas em si, mas o modelo: os nossos comissários técnicos e desportivos, na segunda-feira de manhã, estão nos seus empregos. E o que acontece no fim de semana anterior para quem vive da categoria não os afeta. Não afeta a vida deles. Eles só vão aparecer aqui na próxima convocação que eles tiverem para vir trabalhar. Então esse sistema está manco, capenga”, disse o promotor da Stock Car.
Dificuldades dos comissários
Além da grande carga de trabalho, o mandatário da CBA ponderou que os recursos utilizados pelos comissários não permitem julgamentos tão rápidos no formato adotado pela Stock Car. Além disso, Dadai lembrou que erros acontecem mesmo na maior categoria do esporte a motor, que tem todos os dispositivos para analisar os incidentes na pista. "Na Fórmula 1, você tem muitos recursos, então o comissário tem mais possibilidades. Óbvio que a gente não tem uma condição semelhante".
"A nossa condição técnica melhorou muito ao longo dos anos, mas se comparar com a F1, não temos tantos recursos. E vez por outra, na própria F1, a gente tem alguma situação de polêmica, e é a principal categoria do automobilismo mundial. Então muitas vezes, mesmo com todos os recursos, a gente precisa de um tempo maior para julgar. Mas, sim, a gente tem que achar a equação ideal para que o espetáculo esportivo seja entregue na maior lisura possível", completou.
Embora crítico, o próprio Col se colocou à disposição da CBA: "Não é culpa deles, é de todos nós, e tenho trabalho insistentemente para mudar essa cultura, como parceiro. Estou constantemente dizendo: ‘gente, precisamos mudar isso, melhorar aquilo...’. A única maneira é ser construtivo, não adianta ficar só atirando pedra, mas tem uma cultura a ser mudada, na direção de a gente não ficar a mercê de atitudes amadoras, o que gera desconforto”.
Troca de farpas, mas reafirmação da parceria
Em função das polêmicas causadas em Goiânia, Col foi contundente na entrevista concedida no autódromo da capital: “Meus extintores estão todos descarregados (de tantos incêndios que apaguei). Nós temos uma categoria de muitos profissionais controlada por poucos amadores, que são as pessoas da CBA, a começar por ele, presidente. E não só cobrei, como me desentendi com eles, claramente. Porque se eu me posiciono como parceiro, não posso tomar bola nas costas”.
“Sabe o que eu acho que falta para a CBA? Transparência, inclusive em favor dela própria, porque estou tendo que explicar os procedimentos dela, já que ela não explica. Essa confusão acaba respingando em quem não deve, como aconteceu comigo. A Vicar e sua assessoria não podem publicar nada que não seja oficializado. Não estou fazendo críticas pessoais, e sim ao sistema”.
“Porque o presidente da CBA – e não estou criticando ele, estou criticando o sistema – faz um ‘bico’. Ele vai lá, uma ou duas vezes a cada quinze dias, por algumas horas, e tem o próprio negócio dele. Ele e seus antecessores todos. A diretoria da CBA, por estatuto, nem pode ser remunerada”, disse Col. Apesar da dureza nas palavras, o chefe da Vicar frisava ter a CBA como parceira, dirigindo-se ao aparelho que gravava a coletiva: “Dadai, já falei com você pelo telefone, tá gravado aqui, não estou falando nada diferente”.
Em tom conciliador, mas enfático, o mandatário da CBA respondeu: "A gente tem uma equipe profissional. Não são amadores, são profissionais em tudo que fazem. O fato de você ter outra atividade não significa que você possa ser classificado como amador. A partir do momento em que você está ali e exerce aquela sua atividade com afinco e seriedade, você não pode ser classificado como amador".
"Quando ele coloca que existe essa questão do amadorismo é efetivamente porque a gente não tem pessoas que trabalhem 100% com isso, mas, dentro do que a gente tem de recurso financeiro e de capacidade pessoal, eu diria que o nosso quadro é o melhor possível e, sim, profissional. O fato de não viver daquilo não quer dizer que não seja profissional".
Apesar das divergências, Dadai reafirmou a parceira com Col: "Não existe nenhum tipo de animosidade. Ele contribui muito com a evolução dos processos. A gente sempre procurou linkar sua experiência com a estrutura que nós temos e ele é um cara que está sempre junto e é participativo. Ele tem uma presença importante dentro desse contexto".
"Estive com o Col, inclusive nesta semana. Temos um relacionamento muito bom, me dou super bem com ele. A gente está no mesmo barco, a gente rema junto. Acho que o Col é um grande promotor, muito importante dentro do automobilismo brasileiro. Ele tem uma história que precisa ser respeitada e tem dado, sim, as suas contribuições".
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