Exclusivo: Hamilton abre o jogo sobre Brasil, casos de racismo e recordes na F1
Piloto que começará jornada pelo hepta da F1 no próximo fim de semana abriu coração ao falar sobre os assuntos que estão na cabeça dos fãs brasileiros e pelo mundo
A temporada de 2020 da Fórmula 1 pode ser emblemática para Lewis Hamilton. O inglês tem grandes chances de conseguir o que ninguém esperava ser possível: alcançar Michael Schumacher com sete títulos mundiais e superar as 91 vitórias do alemão (atualmente, acumula 84).
Mas a relevância do piloto não se resume às pistas. Hamilton cresce a cada ano como ícone mundial pelo que faz e diz. Nessa entrevista exclusiva ao Motorsport.com, o hexacampeão abriu o jogo e falou sobre tudo: a relação que tem com o Brasil, dos amigos brasileiros Anitta, Neymar e Gabriel Medina, os rumos do mundo e episódios de preconceito que sofreu: "o mundo está indo na direção errada".
Motorsport.com: O Brasil é um país feito por pessoas de diferentes culturas. Você sente algum tipo de conexão com o país, e como recebe isso, depois de se tornar um ícone do esporte?
Lewis Hamilton: Sinto que tenho uma conexão incrível com este país. Acho que porque quando eu era jovem, estava assistindo o Brasil pela TV. Eu realmente não tinha em ninguém o tipo de aparência que tenho, principalmente nesse esporte. A partir de então, fechei esta conexão. Quando comecei a vir aqui, senti a presença de Senna. E então, sinto que realmente cresci para com o público daqui. Eu também tenho muitos amigos e gosto da cultura, é um grupo muito diversificado de pessoas.
Motorsport.com: Às vezes, as pessoas levam algum tempo para se encontrar, como indivíduo. Como foi que isso aconteceu no seu caso?
Hamilton: Para mim demorou muito tempo, infelizmente. O principal da minha descoberta própria veio quando eu era no centro das atenções. O público em geral pode fazer isso no mesmo período, talvez sem as pressões do julgamento e com constantes críticas, então foi difícil. Mas eu diria que veio tarde porque eu tinha muito controle sobre mim. Eu estava realmente tipo, 'ei, quero fazer isso', mas me bloqueava. 'Mas eu ia me vestir dessa maneira', mas me bloqueava. 'Quero fazer tatuagens', mas me bloqueava. Então eu nunca pude ser quem eu queria ser. Até que finalmente assumi o controle da minha vida quando tinha 25 anos e decidi que tudo bem. Daquele momento em diante, eu ia tomar as medidas necessárias para descobrir quem eu quero ser, como como me sentiria melhor e ser a minha melhor versão.
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Motorsport.com: Quando você procura ver o que está acontecendo no mundo, você acha que estamos melhorando em termos de conexão com as pessoas ou estamos entrando no caminho errado?
Hamilton: Quando assisto ao noticiário, vejo que o mundo está indo na direção errada. O mundo está piorando. A população quer tudo mais rápido, você sabe. Nossa capacidade de concentração está diminuindo. Então, acho que é apenas a direção inevitável da evolução. Estou tentando influenciar positivamente aqueles que estão perto de mim e aqueles que me seguem, para também se darem a capacidade de serem as melhores versões de si mesmos.
Motorsport.com: Temos visto seguidos casos de racismo, principalmente no futebol. Estamos no século 21, quando pararemos com esse tipo de comportamento?
Hamilton: Acho que vai demorar muito, muito tempo. É uma coisa que envolve educação, na minha opinião. Não posso falar por outros países, mas imagino que seja um cenário parecido com onde vivi. Tudo está tudo relacionado à educação das novas gerações, e isso vem dos pais. São os pais que passam os ideais, valores e crenças que têm em mente. E colocam isso nas crianças. Quando eu tiver meus filhos, eu vou dizer: ‘isso é o que eu quero e espero de vocês’. Esse é o círculo da vida. A educação escolar é fundamental. Nela, eu só aprendi a ‘História branca’. Nunca me contaram nada sobre minha cultura. Meus pais me contaram sobre minha história, porque eles queriam falar sobre a cultura deles. Acho que é preciso que as pessoas saibam disso e entendam o que é o racismo e entendam que somos todos iguais, todos estamos conectados à terra, e isso é triste no futebol. Eu me lembro de correr na Itália e havia um homem negro da África que vendia relógios em sua jaqueta, faltava diversidade. E quando você tem líderes, como Donald Trump, que se posicionam de forma que você pode classificar como comentários raciais, e as pessoas assistem TV e veem isso, é como se confirmasse a visão errada de alguns. É um efeito dominó, uma ciclo constante. Quando eu estava no kart, me lembro de ser empurrado para fora da pista o tempo todo. Eu era o único negro lá. E eu queria brigar o tempo todo. Meu pai dizia: ‘Fale na pista. A melhor coisa que você pode fazer é derrotá-los na pista'. E isso foi o que sempre fiz. Eu falei através do meu carro.
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Motorsport.com: Você sente que tem alguma conexão com outros grandes ícones como Stevie Wonder, Muhammad Ali?
Hamilton: Não me sinto conectado a eles, mas acho que todos temos uma responsabilidade. Não importa se você tem 100 milhões de seguidores e é famoso ou se tem 10 seguidores. Todos eles têm um papel, e o que realmente me preocupa é tentar ser o mais positivo possível. Estou constantemente tentando projetar positividade em torno de mim para as pessoas com as quais me conecto, porque a pessoa com quem você se conecta está conectada a outras 10 pessoas e essa pessoa está conectada a mais 10 pessoas e assim por diante. Acho que, é claro, quanto mais alto você está, mais impacto você pode ter. E nem sempre estou necessariamente vendo que cada pessoa com o telefone realmente tem coisas positivas, mas essa é apenas a minha opinião.
Motorsport.com: Sobre as pessoas do Brasil, sabemos que você tem como amigo o Neymar. Quem você é próximo no Brasil?
Hamilton: Digo que meus amigos mais próximos são Anitta, Gabriel (Medina) e Neymar. Eu diria que provavelmente são meus três amigos mais próximos aqui. E é incrível observá-los individualmente fazendo o que fazem. Converse com ela (Anitta) e veja de onde ela veio e o que fez. Eu olho para Neymar vindo das ruas e fazendo o que ele faz e ele está em sua própria jornada, está aprendendo muito, ele ainda é jovem. Você vê Gabriel mudando a cara do surf. Eles são muito brasileiros, muito patrióticos, o que eu adoro ver. Acho que eles representam a maneira como amo o Brasil. Não algo assim de pessoas de outros países, como a Inglaterra. Não ouço as pessoas 'amarem a Inglaterra'. Mas há muitas pessoas na Inglaterra que fazem isso, mas talvez não sejam tão vocais quanto as apresentadas, mas eu amo a cultura, as cores. A música é incrível. E há muitos lugares que tenho que visitar aqui no Brasil.
Motorsport.com: Sobre o Hamilton piloto: nós tivemos a era Senna e depois Michael (Schumacher). Você está vindo para superar o alemão. Sabemos que você sempre disse que não se importa com os recordes e que as pessoas se importam mais, mas você está quase lá, para se tornar o melhor. Como lida com isso?
Hamilton: Eu acho que significa mais para os outros. Nunca busquei números, mas as pessoas que observam de fora, veem isso como mais do que é. Mas acho que é assim que a vida é, como dinheiro, um pedaço de papel que não significa realmente nada, mas percebemos que ele tem um valor. A percepção do lado de fora é quando alguém tem títulos e números e essas coisas que têm peso para mim. Claro que é ótimo ter. E é realmente difícil de explicar. Eu amo corridas, continuarei naturalmente. Quanto mais você alcança, mais conhecido se torna, mais globos oculares estão sobre você. Todos percebem você. Mas, novamente, para mim, ainda sou garoto das ruas do Reino Unido que sonha em ser Superman ou Ayrton Senna. E vivendo um sonho, com certeza.
Os recordes que Hamilton pode 'tirar' de Schumacher:
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