A Batalha dos Híbridos no WEC
Audi, Toyota e Porsche disputam a Guerra da Recuperação de Energia
Por João Correa
Daqui há alguns anos na linha do tempo da humanidade, o nosso DAP (Dispositivo de Assistência Pessoal), algo muito mais abrangente do que os atuais 'smart phones' fará um ruido especial nos avisando que é hora de lhe darmos corda ou umas sacudidas, como fazíamos antigamente com os relógios de pulso chamados de automáticos.
Significará que o sistema operacional do DAP determinou que provavelmente, mais uma vez, dormimos no copkit do simulador holográfico 360º multidimensional e que já está quase na hora onde de apagarmos as luzes e dormirmos diversas horas seguidas, quando sua bateria não será recarregada por nenhuma das diversas fontes de energia que a alimentam, como, além do balanço cinético, sua tela touch screen que também é uma célula fotovoltaica, que usa a nanotecnologia para ser transparente.
Será que essa 'mágica' se dá porque os imaginários DAPs consumirão menos energia? Não. Desde as primeiras décadas do século XXI os circuitos computacionais consomem muito pouca energia para o tanto que fazem. A resposta está na velocidade com que sua bateria absorve e armazena as correntes elétricas que lhe dão carga. Suas baterias não esquentam ou criam resistência a entrada de energia.
Exemplificando melhor: Se fossemos carregar um DAP como atualmente fazemos com nossos celulares, seria algo como pousá-lo no pad de alimentação sem fio e retirá-lo em seguida, assim como hoje passamos um cartão de crédito na máquina de leitura. E... daquele ponto do futuro perguntaremos em que ponto do passado, nosso presente, começamos a desenvolver aquela verdadeira Taça do Santo Graal, que, rapidamente, pode ser repleta com água que será bebida com a velocidade que nossa sede determinar.
Desde que o KERS (Sistema de Recuperação de Energia Cinética) foi desenvolvido para a Formula 1, já há mais de uma década atrás, antes mesmo da nova geração de motores V6 turbinados e em lato senso híbridos, iniciou-se uma corrida para o aproveitamento da energia cinética recuperada de freadas e desacelerações, assim como, mais recentemente, também, da forte exaustão dos motores dotados de turbo compressão. Todo motor elétrico é também, potencialmente, um gerador, ou seja, tanto pode estar gerando torque, - quando gasta energia - quanto - ao girar inercialmente - gerar uma corrente elétrica.
Como se o motor de arranque também se comportasse como um alternador... Quem queira comprovar essa afirmação, basta munir-se de um pequeno ventilador, desses também chamados de FAN da CPU dos computadores, e, na extremidade desencapada dos fios que lhe servem de alimentação, medir, com auxílio de um multímetro, a corrente que será gerada quando movimentarmos suas pás através de um forte sopro... Esse exemplo também dá uma boa ideia de como se recupera energia da exaustão de motores de combustão interna, que sempre liberam gases... Projetos ainda em desenvolvimento permitirão que o calor desses gases também forneçam eletricidade para um dos 3 sistemas de acumulação de energia em disputa no mundo do automobilismo.
Assim sendo, temos que motores elétricos funcionando em paralelo com motores de combustão interna convencionais podem ser utilizados tanto para auxiliar na rotação que leva potência às rodas de um veículo, quanto para gerar eletricidade, quando não está recebendo carga, mas, está sendo rotacionado pela força inercial ou cinética do veículo que não está sendo acelerado pelo motorista e ainda não parou totalmente... Falamos de reciclagem da energia gasta para movimentação de um veículo.
Há dois anos, com o retorno da Porsche à categoria máxima dos protótipos, a LM P1, na disputa da WEC (World Endurance Championship) temos três fabricantes, cada um com seu carro híbrido, com três processos diferentes de absorção e consequente uso da energia recuperada daquela que é gasta para movimentar e parar os veículos que ainda usam motores que queimam combustíveis fósseis.
Esses sistemas de recuperação, a parte aquele da exaustão, também se aplicam a veículos puramente elétricos, o indubitável futuro.
Os Audi R-18 e-tron quatro foi o primeiro híbrido a participar da WEC, tendo ganho o campeonato de 2012 e 2013. O sistema de armazenamento da energia recuperada do R-18 se chama 'flywheel' e é desenvolvido por uma subsidiária da Williams, a equipe de F1. O processo segue a mesma lógica dos discos acoplado às turbinas de algumas hidroelétricas para retificar as correntes em função da intermitência das águas que as acionam. Temos que imaginar um pião que depois de girado se transforma em um dínamo, devolvendo parte da energia que lhe foi aplicada. Um disco de carbono, rodando no vácuo em uma caixa hermeticamente fechada é girado (fala-se de até 60.000 rpm, Mach 3) pela energia vinda do movimento cinético do R-18 quando freia, passando então a disponibilizar uma corrente capaz de auxiliar o motor turbodiesel daquele bólido com adicionais 100HP.
O piloto não tem que acionar nenhum botão para ter essa potência adicional, ela é disponibilizada de forma automática, quando disponível naquele acumulador que poderíamos chamar de analógico ou mecânico. Já os pilotos do híbrido da Toyota, o TS040 HYBRID, campeões da WEC no ano passado, tem que apertar um botão no volante para 'injetar' a energia acumulada em seus super capacitadores nos motores-geradores elétricos que auxiliam seu impulsionamento, tanto no eixo traseiro, como, também agora, no TS040, no eixo dianteiro... O que deixa o veículo em determinados momentos com tração nas 4 rodas, como o R-18. Capacitores – componentes muito comuns na eletrônica - absorvem toda a energia que neles é jogada de forma quase que instantânea, todavia, não conseguem reter por muito tempo essa energia.
Super capacitores conseguem reter a energia por mais tempo, mas não de forma indefinida como uma bateria convencional, portanto, os pilotos do TS040 devem usar essa energia auxiliar ao motor V8 aspirado do bólido de modo conveniente, para fazer ultrapassagens, saídas de curva, etc... Existem muitas tentativas de fazer super capacitores se comportarem como baterias, ou seja, manter a rápida absorção de energia ao mesmo tempo que deixá-la disponibilizada on demand, por tempo igual à das baterias de lítio... A 'Taça do Santo Graal' tecnológico, como ilustramos.
A Porsche, com o seu modelo 914 híbrido, ganhadora da última 24 Horas de Le Mans, apostou em baterias de lítio de alta densidade convencionais, mas, com um sistema de refrigeração de água que pode estar fazendo a diferença na hora de absorver a energia recuperada nas freadas e na exaustão do motor de 2 litros V4 turbo comprimido.
Todos os 3 fabricantes garantem que sua intenção é levar os conhecimentos adquiridos nessa intensa disputa esportiva para o universo dos automóveis convencionais – o que de fato tem ocorrido ao longo da história recente – não escondendo seu interesse financeiro, como era de se esperar, afinal, de algum lugar tem que vir as fortunas que gastam nesses verdadeiros laboratórios que 'voam' à 330~340 km por hora. A Toyota, além do Yaris Hybrid-R, um carro conceito usando super capacitores, já tem parceria com a Tesla para o desenvolvimento de baterias a base de super capacitores e a Porsche, devido a simplicidade industrial de seu projeto, pode, a qualquer momento, lançar um híbrido com características herdadas do 914.
O systema de flywheel da Williams tem diminuído de tamanho drasticamente e certamente poderá ir para o mercado ajudando a diminuir o consumo de combustível dos híbridos e aumentando a autonomia dos carros puramente elétricos.
Só nos resta observar como as disputas são importantes para o desenvolvimento da tecnologia que será aproveitada no futuro por nossos DAPs. Para sorte da humanidade, essas disputas também podem surgir do esporte e do mercado, não somente das guerras.
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