ANÁLISE: Erro da McLaren no GP da Rússia vai muito além da previsão do tempo
Equipe confirmou que lançará uma investigação profunda nesta semana para entender qual foi o principal erro cometido no GP da Rússia
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Quando a McLaren voltar à sede da equipe nesta semana, iniciará uma investigação profunda na cadeia de eventos que colocaram um fim à suas esperanças de vencer o GP da Rússia de Fórmula 1.
E enquanto o chefe Andreas Seidl brincou no domingo a noite sobre a existência de um "grupo escondido de WhatsApp" que poderia concluir que a melhor saída seria parar Lando Norris de cara para colocar pneus intermediários nas voltas finais, a análise deve ir muito além disso.
Olhando para os minutos cruciais que tornaram uma improvável e brilhante vitória de Norris em uma grande decepção, fica claro que, assim como a maior parte das coisas na F1, esse não é um caso em que apenas o britânico ou uma única pessoa no pitwall tenha errado.
Haviam múltiplas decisões a serem tomadas e influências em jogo que levaram a McLaren a permitir que Norris ficasse tempo demais na pista com pneus slicks, quando a situação já se torna insustentável pela chuva.
A previsão do tempo
Daniel Ricciardo, McLaren MCL35M, Lewis Hamilton, Mercedes W12, and Sergio Perez, Red Bull Racing RB16B
Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images
Uma conclusão que surge facilmente é que a McLaren tomou sua decisão sobre os pneus com base em informações incompletas sobre o tempo. Se o sistema meteorológico estivesse falando uma coisa para eles e outra para Mercedes e Red Bull, então essa seria uma fraqueza das mais óbvias.
Porém, diferentemente de décadas atrás, quando as equipes tinham suas informações meteorológicas fornecidas de modo independente, há alguns anos esse serviço passou a ser centralizado. Desde 2017 esse trabalho pertence à Meteo France, que fornece os mesmos dados para equipes, F1 e FIA.
O chefe da Mercedes, Toto Wolff, deixou claro que sua equipe tomou a decisão de parar Lewis Hamilton para colocar intermediários com base no mesmo canal de informação das demais.
"´É a Meteo France, o canal oficial de meteorologia da FIA", disse. "É o que todos têm a disposição".
Então não foi a previsão do tempo da McLaren que estava errada.
Timing errado
Lando Norris, McLaren MCL35M
Photo by: Zak Mauger / Motorsport Images
Um dos aspectos críticos no modo como a chuva chegou a ser uma personagem no fim da corrida de Sochi foi o timing e a incerteza sobre como ela afetaria a aderência da pista.
Caso a chuva tivesse chegado no meio da corrida, com uma alta possibilidade da pista ficar molhada por um tempo, então a decisão pelos pneus intermediários seria óbvia. Mas com três ou quatro voltas para o fim, isso acaba se tornando algo mais crítico, porque uma parada de 25 segundos pode te jogar para o fundo se a escolha não se mostra um acerto imediato.
No caso da McLaren, eles sabiam que, com Hamilton parando e deixando Norris com uma vantagem confortável na frente, os intermediários poderiam ser cerca de 10 segundos mais rápidos por volta, e ainda assim não seria válido parar.
E realmente. Imediatamente após Hamilton entrar, houve um momento em que parecia que os intermediários seriam a escolha errada e as condições melhoraram. Confira abaixo um comparativo dos tempos de volta de Hamilton e Norris nessa janela:
Lap | Tempos de volta de Norris | Tempos de volta de Hamilton |
46 | 01m39.120 | 01m38s942 |
47 | 01m42s783 | 01m42s612 |
48 | 01m54s639 | 01m55s730 |
49 | 01m52s785 | 01m56s879 (Parada) |
50 | 01m57s502 | 02m06s316 (Intermediários) |
51 | 03m11s081 (Parada) | 01m53s532 (Intermediários) |
52 | 02m16s377 (Intermediários) | 01m52s659 (Intermediários) |
53 | 01m52s417s (Inters) | 01m51s465 (Intermediários) |
Como é possível notar, na volta 49, quando Hamilton parou, as condições haviam melhorado e Norris havia começado a ir mais rápido novamente. Max Verstappen foi para os boxes na volta 48. Na 49ª, sua volta foi 02min07s650 mas, na 50ª, fez 01min52s546, o que deixa claro o ponto de mudança.
Caso as condições tivessem se mantido consistentes, então faria total sentido manter Norris na pista, já que o tempo de parada naquele momento era maior que o tempo perdido com os pneus slicks.
Mas aí a chuva ficou pior, e o ritmo do slick foi completamente embora. E, no momento em que Norris sabia que precisava ir para os boxes, já era tarde demais.
Comunicação entre o piloto e a equipe
Lando Norris, McLaren MCL35M
Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images
Nesse ponto de mudança da condição de pista, especialmente em voltas finais de corrida, que o que o radar meteorológico não é tão útil assim. Nestes momentos, o aspecto crítico é o detalhe mínimo de como a chuva está caindo em curvas em particular e como ela está afetando a aderência.
Houve momentos no passado em que as equipes despachavam pessoas para sentar nas curvas e orientar pelo rádio quando o tempo ruim chegava e o quão pesado seria.
Quando a chuva cai pela primeira vez e sua intensidade na superfície da pista é incerta, uma equipe não pode decidir sozinha qual é o momento de parar, a não ser que a previsão do tempo deixe óbvio que uma tempestade está para chegar.
Na Red Bull, onde a decisão de Verstappen de parar na volta 48 se provou decisiva, foi explicado que, quando a chuva é marginal, como em Sochi, eles dependem do feedback dos pilotos.
Como disse o chefe da Red Bull, Christian Horner: "Acho que o ponto de mudança, a decisão deve ser do piloto. Eles que sentem o nível de aderência que conseguem lidar. Eles conseguem ver o tempo melhor que nós até o ponto da troca pelos intermediários. É assim que operamos. Esse ponto de mudança depende do piloto".
Seidl disse que, neste momento da corrida, haviam conversas intensas entre o pitwall e Norris para controlar a situação e tentar resolver o que seria o melhor para fazer. E ambos erraram juntos.
A maldição do carro-líder
Lando Norris, McLaren MCL35M
Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images
Estar na liderança da corrida, com tudo a perder, obviamente torna a decisão de parar muito mais difícil em comparação a estar em segundo com uma diferença confortável para trás. Como o carro da frente, Norris não tinha a opção de seguir o que Hamilton faria, ou fazer o oposto como forma de responder.
Além disso, com Hamilton tendo uma vantagem de 40 segundos para o terceiro colocado Sergio Pérez, ele não perderia a posição ao parar, então o único ponto negativo é que, se a chuva parasse a pista secasse, ele teria parado por nada.
A decisão da Mercedes naquele ponto de parar Hamilton também foi facilitada pelo fato da equipe ter visto como Valtteri Bottas estava indo bem, com o finlandês não tendo nada a perder com a parada cedo.
Na perspectiva da McLaren, não havia nenhuma informação sobre o segundo carro, com Daniel Ricciardo em uma boa posição para pontuar.
Como Seidl disse: "Após seu rádio, Lewis também queria ficar na pista. E obviamente ele teve a chance de fazer o oposto do que estávamos fazendo. Essa é a situação quando se está liderando".
A dificuldade de fazer algo primeiro sendo o líder é algo que foi destacado neste ano no GP da Hungria no momento da relargada. Sem saber o que os demais fariam, Lewis Hamilton foi o único a seguir na pista com pneus intermediário, enquanto todos os demais entraram nos boxes para colocar compostos de pista seca.
Uma decisão clara
Lando Norris, McLaren MCL35M, makes a stop
Photo by: Charles Coates / Motorsport Images
O foco mais intenso da McLaren será em cima da informação que tinha disponível na volta 50, possivelmente o último ponto em que poderia ter parado e ainda vencer a corrida.
Será necessário entender por que a informação possível não forçou a equipe a fazer a troca pelos intermediários, seja pelo radar meteorológico, imagens de televisão ou até mesmo oque estava acontecendo na pista e os tempos dos carros que já haviam parado.
E também se a decisão de Norris de se manter na pista foi baseada nele sendo informado corretamente sobre o que era previsto com relação à chuva. O próprio piloto disse após a corrida que foi sua decisão de não entrar nos boxes, com base nele sendo informado de que a chuva não pioraria.
"Eu decidi ficar na pista porque a equipe disse que seria apenas uma garoa como aquela e que não passaria disso. Por algum motivo, não vimos ou não antecipamos que não seria apenas uma garoa e sim muita chuva. E foi nisso que erramos".
Para Seidl, todos os aspectos de seu processo de tomada de decisão precisam ser revistos.
"Como sempre, nessas situações complicadas, é a comunicação entre o piloto e o pitwall usando toda a informação disponível que temos em termos de previsão do tempo, o que os outros carros estão fazendo, tentar informar Lando e, ao mesmo tempo, receber feedback dele sobre como estão as condições".
"É assim que a decisão precisa ser tomada quanto a parar ou não. Lando, com a informação que recebia de nós e como ele se sentia na pista, se sentia bem para ficar com os slicks".
"E, no final, não revertemos sua decisão como equipe. Então isso é algo que precisamos olhar. Ver o que poderíamos fazer melhor porque, claro, olhando agora, tomamos a decisão errada como equipe".
Lewis Hamilton, Mercedes W12, makes a pit stop
Photo by: Steve Etherington / Motorsport Images
Enquanto a Mercedes foi mais inflexível e exigiu a entrada de Hamilton, mesmo que o heptacampeão quisesse seguir na pista com slicks, o ponto de não-retorno da McLaren veio quando deixou Norris seguir porque ele estava feliz.
O que precisam chegar ao fundo para descobrir é se havia informação disponível que poderia ter sido usada de forma melhor em seu processo de tomada de decisão para evitar novos casos.
Seidl disse: "Se tivéssemos sido claros do lado da equipe e estivéssemos 100% certos de que era a decisão correta de parar, ele teria parado".
"No final, foi uma decisão acirrada. Claro, é fácil dizer depois que foi a errada porque foi o que aconteceu, mas eu acho que era muito próximo para decidir o que era o certo a ser feito. E é por isso que digo que foi uma decisão de equipe, tomada junto com Lando".
"A única coisa que precisamos analisar é se existia alguma informação disponível que deveria nos levar a tomar uma decisão óbvia. Mas, no fim, com a informação que tínhamos em mãos naquele momento, com a previsão do tempo, o feedback de Lando, no final, tomamos essa decisão juntos".
Melhorar a equipe
Lando Norris, McLaren MCL35M
Photo by: Charles Coates / Motorsport Images
Enquanto a McLaren ficará arrasada pelo que aconteceu por um tempo, Seidl tem experiência e sabedoria suficiente para saber que o desapontamento pelo GP da Rússia trará benefícios no futuro, garantindo que isso não acontecerá novamente no futuro.
E, para uma equipe que está em uma "jornada em direção à frente do grid", como ele mesmo chama, os dias em que você erra acabam sendo mais valiosos do que aqueles como Monza, em que tudo acaba sendo perfeito.
"Parte desta jornada é que você também precisa aceitar que nem sempre as coisas irão adiante. É uma parte normal do esporte. E você tem dias como hoje, que são grandes desapontamentos".
"Mas é também uma oportunidade de se manter humilde, mantendo ambos os pés no chão, mantendo o respeito por todos os competidores também e, simplesmente, seguir aprendendo".
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