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Chico Rosa: o herói 'padrinho' por trás dos grandes pilotos e responsável por fazer Interlagos ser o que é

Engenheiro do interior de São Paulo pintou as cores do Brasil na Europa e entregou ao mundo grandes joias do automobilismo nacional com seu 'heroísmo' quase anônimo

Chico Rosa e Bernie Ecclestone

A figura de um herói, muitas vezes, vem floreada pela nossa mente pela imagem de um homem, ou até mesmo de uma mulher, alto, forte, intimidador. Em alguns casos, eles usam uma capa, máscara ou adereço que deixe claro que aquele ali é um herói. Na vida real, esse seres místicos são muitas vezes discretos. Seu heroísmo é executado, em grande parte, no silêncio, sem grandes alardes, sem grandes propagandas - eles apenas vão lá e fazem. Por amor.

Chico Rosa e Niki Lauda

Chico Rosa e Niki Lauda

Nas histórias em quadrinhos, nos filmes e livros, eles não se vão. Não morrem. Na vida real, no entanto, não é bem assim. O automobilismo brasileiro perdeu um dos seus heróis, uma lenda. Francisco Castejon do Couto Rosa, de apelido simples, Chico Rosa. Discreto e amigável, o engenheiro quase anônimo pode tranquilamente ser caracterizado como herói - uma opinião que, sem dúvidas, é compactuada por aqueles que tiveram o prazer de conviver ao seu lado e de ser 'apadrinhado'.

E não foram poucos. Aqueles que arriscaram seguir carreira dentro do cockpit, rumo à Fórmula 1, na década de 60 tiveram um 'pequeno empurrãozinho' por parte de Rosa. Heróis têm poderes especiais e Chico tinha o dele: o dom de reconhecer um campeão mundial. Não é surpresa para ninguém que em 1969, já famoso na redoma do automobilismo mundial pelo seu vasto conhecimento em relação às nuances de um carro de corrida e tudo que envolvia aquele 'mundo' fora das pistas, e com passagem pela Willys em 64, foi até a Inglaterra apresentar à Europa um menino promissor: Emerson Fittipaldi - como o próprio conta.

"Chiquinho Rosa é uma história muito longa. Eu o conheci quando eu comecei a correr de kart, no kartódromo de Ribeirão Preto, e desde então ficamos muito amigos. Ele acompanhava as minhas corridas no Brasil na época e ele era amigo da nossa turma e a gente falava muito sobre a ideia de ir para a Europa, eu tinha esse sonho, e em fevereiro de 1969 eu resolvi ir para Inglaterra correr de Fórmula Ford. Fui, comprei o Fórmula Ford, eu trabalhava de mecânico em uma fase muito difícil por lá e falando com o Chiquinho, ele veio para ficar comigo e me ajudou muito no começo da minha carreira. Inclusive, a primeira vez que eu fui correr de Fórmula Ford na Itália e na Bélgica, fomos nós dois em um caminhãozinho, sem mecânico, nem ninguém e fomos para corrida!  Eu tenho muitas histórias com ele desde o começo."

Chico Rosa

Chico Rosa

O êxito de Emerson a partir dali dispensa palavras: Fórmula 3, Fórmula 2 e bicampeão mundial de Fórmula 1 - tudo isso, passando primeiro pelas mãos daquele 'herói'. Uma característica comum desses 'personagens' é a capacidade de ajudar e encantar diversas pessoas. Chico Rosa, nesse aspecto, era unanimidade.

"Nossa amizade se tornou para a vida inteira. Quando cheguei à Fórmula 1, obviamente, o Chiquinho estava mais no Brasil do que na Europa, mas ele vinha às vezes e todo fim de ano a gente sempre se via. Ele era uma pessoa excepcional, conhecia tudo de automobilismo, era um apaixonado por automobilismo tanto do Brasil quanto fora. A gente falava muito da parte internacional, sobre o meu sonho de ser piloto de F1 e ele era muito sábio, conselheiro, amigo e estava sempre em qualquer situação, desde o kart até a Fórmula 1. Eu tenho muita gratidão por tudo que ele me ajudou, me aconselhou. Eu tive muitas pessoas que me ajudaram ao longo da vida e ele foi um dos que me ajudo muito. Só tenho que agradecer a Deus por ele estar em grande parte da minha vida", recorda Fittipladi emocionado.

Claudio Carsughi, jornalista, comentarista e crítico renomado e um dos mais experientes do eixo automobilístico e com quem teve o prazer de conhecer e experimentar uma relação profissional com Rosa, faz esse destaque. "Chico foi um amigo que eu tive ao longo das décadas, que conheci no automobilismo brasileiro, do qual ele foi uma figura de grande importância e que vai deixar muita saudade."

Chico Rosa e Cláudio Carsughi

Chico Rosa e Cláudio Carsughi

Depois de 'usar seu poder' com Fittipaldi, o engenheiro voltou a 'ostentá-lo'. Em 1970, assessorou José Carlos Pace na sua aventura pela Europa. Nessa altura, o verde e amarelo do Brasil já brilhavam no exterior por conta desse herói baixinho e destemido. Quando um outro piloto promissor pintou no horizonte, ao retornar ao país natal e frequentar Interlagos - um dos seus lugares favoritos no mundo - Chico Rosa estava lá para 'lançá-lo': Nelson Piquet

Os dois embarcaram rumo à Europa e Piquet foi apresentado a uma das figuras mais 'icônicas' do automobilismo: Bernie Ecclestone, que naquela altura, era o chefe da equipe Brabham e que se tornou amigo pessoal do brasileiro, daqueles que você cumprimenta e abre um sorriso quando o vê.

Herói, de acordo com o dicionário, é o "termo atribuído ao ser humano que executa ações excepcionais, com coragem e bravura, com o intuito de solucionar situações críticas, tendo como base princípios morais e éticos". Ações excepcionais que em incontáveis vezes não veem a público. Mas que possuem uma importância gigantesca. Os casos de Fittipaldi e Piquet não foram as únicas contribuições de Rosa (mas já pensou se não tivéssemos Emerson e Nelson?).

Chico Rosa, Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet

Chico Rosa, Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet

Não há quem duvide, a partir de agora, que Chico Rosa é o herói de JP de Oliveira, piloto brasileiro que atualmente corre no Japão, mas que, para chegar lá, foi abraçado por aquele que, fisicamente, era até mesmo menor do que ele. 

"O Chico representa para mim praticamente tudo porque sem ele, acho que eu não estaria onde estou hoje. Eu devo muito a ele. Chico foi um cara que não media esforços, fazia de tudo possível para me ajudar, sempre fez. Ele tinha muito carinho por mim e me tratou sempre como um filho, sempre me ofereceu toda ajuda possível."

"No momento que eu mais precisava, que era o momento que eu estava no fim da minha carreira de Fórmula 3, eu não tinha condições para ir para Europa e correr no automobilismo europeu, era preciso um investimento alto e foi neste momento que ele foi essencial, foi a chave, a ignição da minha carreira porque foi ele que me apresentou dois investidores que, na época, deram o passo inicial para que minha carreira pudesse continuar na Europa."

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O amor por Interlagos

Carinhosamente apelidado de 'Prefeito de Interlagos', o engenheiro também mostrou seus super poderes para algo não animado. Convidado a administrar o autódromo, que hoje é considerado um templo do automobilismo mundial, Chico Rosa colocou todo seu amor e dedicação àquele lugar. Mas Interlagos só é o que é, por também ter sido apadrinhado pelo herói brasileiro.

"Chico foi administrador por décadas de uma coisa que ninguém queria, que era o Autódromo de Interlagos", confessou Carsughi ao se recordar da década de 80, quando a pista passava por uma 'crise' profunda e não havia quem batesse no peito para assumir responsabilidade com o intuito de reerguer o palco das joias que ele havia levado ao mundo.

"O automobilismo brasileiro perdeu muito, perdeu uma coluna de sabedoria, de conhecimento, de entendimento, de paixão. Ele ajudou a desenvolver os pilotos, o automobilismo brasileiro e ajudou muito Interlagos, como administrador ele conseguia fazer os investimentos no lugar certo, a manutenção certa. Ele cuidou muito do Autódromo", recordou Emerson Fittipaldi.
 
Foi tirado de sua casa em 2015, com a modernidade instalada na Fórmula 1 - e ele era um daqueles que gostava de gerir à moda antiga, verificar tudo de perto. Sua saída causou espanto, todos entendiam que era como se tivessem lhe apresentado a sua 'kryptonita'. Castilho de Andrade, jornalista e diretor de imprensa do Autódromo desde 2006, pôde aprender e viver Chico Rosa de perto e em sua segunda casa.  
Chico Rosa e Nelson Piquet

Chico Rosa e Nelson Piquet

"Minha relação com Chico sempre foi muito estreita. Ele me contava muitas coisas, me ajudou muito. O conhecimento que ele tinha sobre os carros, sobre como administrar esse mundo, sobre o automobilismo, era algo que nunca vamos ver novamente. Quando ele voltou para o Brasil, foi convidado a cuidar do autódromo e por conta disso, tivemos uma parceria muito especial. Interlagos só é o que é hoje, um templo, respeitado mundo afora, por conta dele e pelo o que ele fez pelo automobilismo do Brasil."

A SPTuris, responsável por administrar o Autódromo de Interlagos desde a época de Chico, por meio de nota, expressou seus sentimentos. 
 
"A São Paulo Turismo manifesta o seu profundo pesar pelo falecimento de Francisco Castejon do Couto Rosa, reconhecido como um dos maiores entendedores de carros de corrida durante as décadas que dedicou ao automobilismo nacional. Chico Rosa foi assessor da SPTuris de janeiro de 2006 a outubro de 2015, atuando na administração do Autódromo de Interlagos."
 
Consternação nas redes sociais 
Nas redes sociais, modernidade que Chico acompanhava de perto, a sua ida foi muito sentida. Principalmente por aqueles que sabem valorizar o feitos de quem muito fez para o automobilismo do Brasil ser o que é hoje. 
 

 

 
 
 
 
 
 
 
Quando os heróis se vão, deixam um legado. Chico Rosa deixou o dele no Brasil e mundo afora. Se hoje o automobilismo nacional é visto como potencia e Interlagos é considerado um templo que jamais deverá ficar fora do calendário oficial, é por conta de um brasileiro, quase anônimo, do interior de São Paulo apaixonado por carros que jamais deixou de acreditar.
 
Os heróis nunca morrem - apenas trocam de lar. 

 

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