Sonho da F1 termina cada vez mais cedo para jovens pilotos
Ausência de categorias de base e alto custo na Europa fazem com que pilotos voltem ao Brasil para se tornarem "profissionais do automobilismo" cada vez mais cedo
O Brasil viveu a maior exposição de seus pilotos via monopostos. Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet e Ayrton Senna trouxeram glórias que alavancaram o esporte e o fizeram chegar a segundo ou terceira modalidade do país.
A consequência disso foi o número crescente de interesse entre jovens em escrever sua própria história na Fórmula 1. Mas nem tudo são flores. Uma grande ausência de títulos mundiais e as dificuldades em nossa terra fizeram que esses sonhos fossem adaptados à realidade cada vez mais cedo.
Um dos exemplos é do jovem piloto de 19 anos, Lukas Moraes. Após passagem pelo kart, ele esteve na F-Abarth italiana, terminando em 4° lugar em 2013. Ele voltou ao Brasil e foi vice-campeão da F3 em 2014. Neste ano, ele acabou decidindo participar do Brasileiro de Turismo.
Questionado sobre o que o motivou a voltar, Lukas falou de um assunto comentado por todos os personagens consultados.
"A minha volta ao Brasil foi por motivos financeiros, já que correr na F3 europeia, que seria o meu próximo passo, estava além do nosso orçamento. Além disso, foi também com a intenção de ganhar mais experiência para uma possível volta à Europa para a F3."
Lukas foi vice-campeão na versão brasileira da categoria que gostaria de estar na Europa, perdendo o título para Pedro Piquet, que a partir de 2016 vai encarar o desafio que Moraes almejava. Mas antes de dar segmento ao sonho dourado do monoposto, Lukas se viu obrigado a traçar novos planos para a carreira.
"Não tínhamos o apoio financeiro para voltar à Europa e tínhamos esse apoio para o Brasileiro de Turismo. Sabíamos que daria para fazer mais um ano na Europa, mas daí em diante não tínhamos nada previsto, então vimos com bons olhos fazer Turismo, mirando a Stock Car ano que vem ou em 2017."
Sem escolha
Caso semelhante viveu Felipe Fraga, que já está na Stock Car, tendo como companheiro de equipe Marcos Gomes, favorito ao título da categoria deste ano. Ele é mais categórico quando fala dos motivos que o fizeram desistir de tentar a Fórmula 1.
"No Brasil falta muito apoio, principalmente financeiro. São poucos os que conseguem ter uma família que banque por um longo tempo. Eu não desisti do monoposto, mas no meu caso, tem uma hora que você não tem escolha."
Fraga fala também na transformação de ambições. Se antes o jovem piloto no kart busca ser um novo Senna, Piquet ou Fittipaldi, se tornar um profissional do automobilismo hoje é o mais viável.
"Tem muitos pilotos que sonham com Fórmula 1, mas também tem outros que sonham em ser profissionais e fazer o que gosta, então é aquilo que toda pessoas busca fazer na vida, trabalhar no que gosta."
E mesmo com todos os problemas, Fraga destaca como vive um piloto da Stock. "Os pilotos da Stock Car são bem pagos, então correr na Europa fica cada dia mais difícil porque a economia do nosso país só piora."
Mas se por um lado a categoria principal de turismo atinge os objetivos profissionais, a base continua ruim. "Até temos pistas, mas não temos categorias. Você vê, a F3 daqui usa carros de 2009. Corri muito com o F3 daqui e quando fui fazer a Fórmula Renault, parecia que eu nunca havia corrido de fórmula na vida."
"Na Europa, você passa um ano treinando e depois estreia na categoria e ainda falam que você é 'rookie'. Na realidade somente os brasileiros é que estão no primeiro ano, que já compete sem tanto preparo."
Stock como estabilidade
Outro piloto da Stock que comentou o assunto por até ter um roteiro na carreira parecido com os casos anteriores foi Popo Bueno. O irmão de Caca Bueno também destacou a transformação do sonho e do glamour da Europa, sendo substituído por um projeto de carreira mais estável em terras brasileiras.
"É claro que quando você é criança, você sonha em estar na F1, sonha em ser Ayrton Senna, mas acredito que os pilotos hoje visam estabilidade, tentar viver de corrida. A carreira em fórmula é um funil que é cada vez mais apertado."
Allam Khodair também viu na categoria que terá o título decidido no domingo um bom potencial para modificar o sonho de infância.
"Quando voltei, com 23 anos, vi que daria para correr de maneira profissional e em 2004 comecei aqui na categoria e foi uma das decisões mais acertadas na minha vida."
A ascensão de uma categoria de turismo, como a Stock Car, vista como grande opção para pilotos que não conseguem dar prosseguimento ao sonho de chegar à F1 é algo que já acontece em outros países. Na Argentina, por exemplo, o automobilismo local é forte, mesmo tendo como único nome o de Juan Manuel Fangio, ainda nos anos 1950.
Para corroborar com a transformação da vocação de um país no automobilismo, nosso primeiro personagem, Lukas Moraes resumiu em apenas uma frase aquilo que se modifica dentro de cada piloto. "O sonho não acaba, ele se transforma."
Colaborou: Gabriel Lima
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