Análise

ANÁLISE: Como a luta de Hamilton pelos direitos humanos coloca a F1 sob os holofotes

A emergência recente de Lewis Hamilton como uma 'consciência' da F1 coloca a categoria sob os holofotes em diversas questões

Lewis Hamilton, Mercedes

Como uma personalidade global, as palavras de um campeão mundial da Fórmula 1 como Lewis Hamilton carregam um peso, e o britânico recebeu a oportunidade de usar sua fama para o bem. Em seu crédito, ele tem feito isso consistentemente, e sua passagem pelo Bahrein no início da temporada fez seu foco se voltar aos direitos humanos.

A F1 viaja para vários países onde o assunto é um problema para a população. É inevitável que um grande evento internacional como o GP atrai atenção, e isso gera acusações de sportwashing, quando um local se aproveita do esporte como cortina de fumaça para esconder seus problemas.

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O GP do Bahrein é foco dessa atenção há muitos anos, mesmo antes dos protestos no país que levaram ao cancelamento da edição de 2011.

Naquela época, Hamilton corria pela McLaren, uma equipe que tem acionistas bareinitas, e enquanto ele sempre foi honesto, tinha receio de expressar suas visões pessoas em certos assuntos.

Desde então, ele ficou mais velho e maduro como ser humano. Ele cresceu para um papel de ativista em diversos assuntos. 

Lewis Hamilton, Mercedes takes the knee

Lewis Hamilton, Mercedes takes the knee

Photo by: Charles Coates / Motorsport Images

No ano passado, ele falou sobre vários tópicos e liderou a manifestação antirracismo feita antes do GP, com vários pilotos se ajoelhando, expressou seu apoio ao movimento Black Lives Matter e ajudou a persuadir a Mercedes a focar em questões de diversidade.

Antes do GP do Bahrein, em novembro do ano passado, Hamilton foi abordado por grupos de direitos humanos, e não temeu ao expressar seu apoio, mas de modo pensado e conciliatório.

"Quando cheguei aqui, recebi algumas cartas, mas não tive ainda muito tempo para assimilá-las", disse à época. "Então isso é algo que preciso fazer nos próximos dias. Naturalmente, há problemas com direitos humanos em alguns países que visitamos. E esse ano mostrou o quão importante isso é para nós, não apenas nosso esporte como para os demais, usando nossas plataformas para advogarmos por mudanças".

"Naturalmente, somos um dos poucos que visitam tantos países diferentes. Acho que, como esporte, precisamos fazer mais. Acho que demos um passo nessa direção, mas sempre podemos fazer mais".

"Acho que eles deram alguns passos nos lugares que visitamos, mas é importante garantirmos que isso será implementado do modo correto. Não podemos apenas dizer que vamos fazer algo. Precisamos ver as ações sendo tomadas. E isso depende de algum trabalho nosso nos bastidores".

Os comentários de Hamilton foram bem recebidos por ativistas, notoriamente o Instituto do Bahrein por Direitos e Democracia (BIRD). Mas quando ele foi atingido pela Covid-19 antes do GP de Sakhir, ele não teve a oportunidade de dar sequência a isso enquanto estava no país.

Antes do GP do Bahrein, um grupo de 61 parlamentares britânicos escreveram ao novo CEO da F1, Stefano Domenicali sobre questões de direitos humanos no Bahrein, citando casos individuais notáveis, com alguns diretamente ligados a protestos sobre as visitas esportivas ao país.

Significativamente, a carta também citou os comentários de Hamilton, refletindo sua influência.

"Pedimos que você reconheça publicamente as preocupações legítimas com os direitos humanos vocalizadas por seu campeão, Sir. Lewis Hamilton; estabeleça uma investigação independente sobre os abusos especificamente ligados às corridas; e se encontre virtualmente, e de modo privado, com pessoas da área de direitos humanos e vítimas, antes da corrida".

Em sua chegada ao circuito, na quinta antes do GP, Hamilton foi questionado novamente sobre o tema. Ele disse que, desde novembro, tomou passos para compreender melhor o assunto, indicando que fala seriamente sobre fazer uma diferença.

Valtteri Bottas, Mercedes-AMG F1, 2nd position, and Lewis Hamilton, Mercedes-AMG F1, 1st position, on the podium

Valtteri Bottas, Mercedes-AMG F1, 2nd position, and Lewis Hamilton, Mercedes-AMG F1, 1st position, on the podium

Photo by: Charles Coates / Motorsport Images

"Recebi aquelas letras no ano passado, que me impactaram. Foi a primeira vez que recebi cartas do tipo em minhas viagens. Nos últimos meses, tirei um tempo para aprender, porque após visitar aqui por tantos anos, eu não tinha ciência desses detalhes envolvendo os direitos humanos".

"Passei tempo falando com especialistas em direitos humanos, com organizações como a Anistia. Falei com o embaixador do Reino Unido para o Bahrein e falei também com autoridades do país".

"No momento, acredito que tomei passos privados e acho que esse é o melhor caminho para seguir. Então não quero falar muito para não prejudicar esse progresso. Essa é a minha posição agora. Mas definitivamente estou comprometido a ajudar como puder".

Perguntado se a F1 deveria ter mais responsabilidade na escolha dos locais que visita, Hamilton admitiu que era difícil para ele comentar sobre isso.

"É uma boa questão, e não é meu poder escolher onde corremos ou não. Mas refletindo sobre a posição poderosa que temos em termos de responsabilidade, direitos humanos, não acho que isso deva ser um assunto político".

Na sexta antes do GP, o BIRD revelou que Domenicali respondeu a carta dos parlamentares britânicos. Enquanto reconheceu que os direitos humanos são um tópico importante para a F1, ele insistiu que há um limite no impacto que a categoria pode ter em um país que visita.

"Quero dizer que a F1 trata com extrema seriedade esse assunto", escreveu Domenicali. "Mas nós acreditamos também que o esporte sempre teve um papel único em unir diferentes culturas, atravessando fronteiras, sendo uma força para o bem".

"Acreditamos que isolar países do esporte não é a abordagem correta, e o engajamento é muito melhor que o isolamento".

"Nossa política de direitos humanos é muito clara e determina que as empresas da F1 são comprometidas a respeitar direitos humanos internacionalmente reconhecidos em suas operações globais e tornamos nossa posição sobre direitos humanos clara para nossos parceiros e países-sede, que se comprometam a respeitar os direitos humanos no modo em que seus eventos são realizados".

"Nós falamos em detalhes com o BIRD e parlamentares nos últimos anos e levamos os assuntos discutidos com o Instituto para as autoridades relevantes no Bahrein e no Reino Unido".

"Porém, é importante deixar claro que a F1 não é uma organização que realiza investigações. Somos uma detentora de direitos esportivos que tem o importante trabalho de promover nosso esporte ao redor do mundo de acordo com as políticas destacadas anteriormente".

Considerando que a F1 e a Liberty Media são parceiras de longa data do governo do Bahrein, obviamente é um assunto espinhoso para Domenicali, que ainda é novo no trabalho. E isso não ficará mais fácil, já que a edição inaugural do GP da Arábia Saudita se aproxima.

Enquanto isso, Hamilton mostrou mais uma vez que não tem medo de falar sobre assuntos difíceis como racismo e direitos humanos, e faz isso com classe e pensamento.

"Acho que enquanto envelheço, começo a entender mais. Acho que todos passamos por uma fase educativa no ano passado, estamos aprendendo mais e tivemos muitas discussões. Eu assisti mais documentários, li mais, tentei me educar sobre o que estava acontecendo no mundo".

"E isso não parou. Definitivamente me senti mais empoderado ao não ficar em silêncio, como muitos gostariam que eu fosse. Definitivamente noto que um lado leva muito para o pessoal quando eu me ajoelho. Quero que a comunidade negra saiba que eu escuto vocês, vejo vocês e estou ao seu lado".

"E isso é importante para mim. Mas, pelo caminho, há muitas coisas que precisamos lidar ao redor do mundo. Naturalmente, não posso resolver tudo, mas quero ajudar".

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