ANÁLISE: Por que as novas regras podem mudar a F1 para sempre
Um pacote ousado de regras com o objetivo de garantir a sobrevivência da F1 a longo prazo deve ser aprovado hoje pela FIA
Após receber o apoio das equipes da Fórmula 1 na semana passada, o novo conjunto de regras, que cobre uma grande variedade de áreas como chassi, motor, regulamento esportivo e financeiro, deve ser aprovado pelo Conselho Mundial de Automobilismo da FIA nas próximas horas, em uma votação online.
Mas, enquanto boa parte das discussões na mesa durante as últimas semanas focaram no corte de gastos e, especialmente, na redução do teto orçamentário de 2021, as mudanças cobrem boa parte do esporte e devem mudar a cara da categoria pelos próximos anos.
A introdução do teto orçamentário deve levar a uma redução interna das equipes. A McLaren anunciou essa semana que deve cortar cerca de 70 pessoas de seu programa da F1 para manter as operações dentro do teto. A britânica foi apenas a primeira a se manifestar sobre isso, com a expectativa de mais anúncios do tipo nos próximos meses.
Para as montadoras que fornecem motores, haverá um retorno ao cenário enfrentado por elas há alguns anos, quando um motor tinha seu desenvolvimento congelado para manter os gastos sob controle, no final da era V8.
A ideia é que limitar mudanças em diferentes componentes da unidade de potência - apenas um para 2021 e além - seja um começo para congelar todo o desenvolvimento a partir de 2023
Com o desenvolvimento dos motores congelado, é provável que a categoria possa fazer ajustes no design da unidade de potência - em vez de uma revisão radical - quando um novo regulamento for considerado, para 2025.
Esses planos devem ser bem recebidos por todas as montadoras, especialmente porque os gastos com desenvolvimento de motores não fazem parte do teto orçamentário atualmente.
Cyril Abiteboul, chefe da Renault, disse recentemente ao Motorsport.com: "Nós conseguimos lutar para contar a corrida louca que existe no desenvolvimento de motores, e é realmente insano o quanto estamos gastando com isso. Finalmente isso deve mudar".
Sebastian Vettel, Ferrari SF1000
Photo by: Giorgio Piola
Mas não é o controle de gastos e de desenvolvimento que são a base da mudança em potencial para o esporte, porque a F1 está para embarcar em um novo modelo de pensamento que pode mexer com a ordem e a competição.
Há anos, a F1 tem focado quase que totalmente em manter uma meritocracia, onde as equipes com a melhor performance recebem os melhores prêmios. Havia pouca compaixão para equipes pequenas ou menores em comparação às gigantes do esporte.
Mas essa lista de benefícios para as equipes da ponta, tanto no lado financeiro quanto no político, com a criação do Grupo de Estratégia, levou à criação de uma F1 de dois níveis, onde Red Bull, Ferrari e Mercedes se tornaram basicamente intocáveis.
A Liberty Media planejava essa revolução nas regras para 2021, mas que agora serão introduzidas em 2022 devido à pandemia, tem como objetivo lidar com essa questão.
Porém, a pandemia do coronavírus parece ter criado uma situação em que as equipes estão mais abertas em pensar no coletivo, e é por isso que existe esse primeiro passo para realmente ajudar a criar um campo mais equilibrado para o esporte.
Regras como um sistema de desvantagem no desenvolvimento aerodinâmico, onde as equipes mais lentas têm a possibilidade de usar o túnel de vento por um período de tempo maior, além do uso de peças com código aberto, são conceitos que seriam inimagináveis há 12 meses.
Para Abiteboul, essas ideias são encorajadoras para o futuro do esporte.
"Pela primeira vez, a F1 se voltará mais para as tecnologias abertas que estamos desenvolvendo. Ter todas as equipes colaborando juntas e desenvolvendo o que é melhor em certas áreas do carro, com componentes de código aberto, é algo que eu acho fantástico".
"É muito melhor, muito mais eficiente, mais justo e transparente, do que acordos com equipes clientes".
As mudanças não vão tornar equipes como a Williams campeãs novamente de imediato, e dificilmente vai impedir que os melhores cérebros produzam os melhores carros, mas talvez possa mudar o cenário suficiente para que a F1 deixe de ser tão previsível.
E, como uma fonte disse, isso também marca um importante primeiro passo para a F1 mostrar modos para que as equipes e chefes trabalhem juntos para criar algo melhor para o coletivo ao invés de apenas um time.
Se as regras de aerodinâmica e a ideia do código aberto funcionarem, por que não ir além, fazer mais mudanças no regulamento que tragam mais benefícios para as equipes mais lentas - para que a competição esteja sempre próxima?
Ao invés de ver esses planos de cooperação como a morte da F1 por criar uma ordem falsa, ela pode acabar tornando o sucesso ainda mais merecido e especial.
No ano passado, Carlos Sainz falou sobre como a MotoGP convenceu todas as montadoras a abraçar as regras de concessão, onde as montadoras que não tiverem um certo nível de performance poderão realizar mais testes e introduzir mais desenvolvimentos.
"O comentário geral é que as equipes de ponta estavam céticas em um primeiro momento, mas agora acredito que estejam mais felizes, porque elas ainda estão vencendo, mas estão ganhando em lutas com mais pessoas", disse.
"Isso torna a montadora e a marca mais fortes, porque eles estão lutando contra mais marcas. É um bom exemplo e é algo que eu gostaria de ver no futuro da F1".
Essas esperanças devem ser respondidas logo, e podem abrir as portas para uma F1 diferente no futuro onde ideias como essa são a norma básica.
Perguntado sobre esse novo espírito, Abiteboul disse: "Estamos em um esporte, estamos competindo entre si e não vamos remover isso. Isso precisa ficar".
"Mas encontrar uma maneira para que as equipes possam colaborar um pouco mais pode ser uma lição tirada nessa crise, e é algo que está presente na geração mais jovem, essa colaboração entre companhias e nações, ver isso na F1. Talvez teremos isso nesse novo acordo, uma estrutura para esse tipo de coisa".
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