Stock Car: Andreas Mattheis prepara saída e detalha plano de sucessão da equipe

Gestão de time mais longevo da categoria deve ser passada para Guilherme Gonçalves, o Guiga

Guilherme Gonçalves, o Guiga, com Andreas Mattheis

Foto de: Bruno Terena

Um dos pilares da Stock Car Pro Series em seus 45 anos de existência no automobilismo brasileiro é a equipe de Andreas Mattheis. Atualmente sob o patrocínio da Ipiranga o time sediado em Petrópolis (RJ) coleciona títulos e reconhecimento como um dos gigantes da maior e mais importante categoria do País.

No dia 24 de maio, Andreas, que também tem conquistas como piloto, completou 70 anos de idade, o que pode levar o fã a imaginar que em breve o carioca terá que se afastar. De todo modo, este pensamento não está errado, mas surpreende imaginar que ele vem pensando nisso há pelo menos 10 anos.

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É o que o próprio admitiu em entrevista exclusiva ao Motorsport.com, durante o fim de semana da etapa do Velocitta.

“Eu vou ter que começar as histórias desde o início”, disse Andreas. “Eu fiz 70 anos agora e desde os 60 eu comecei a me preocupar em como dar continuidade à minha equipe, sem que ela caísse na obsolescência.”

“É natural que você comece a envelhecer, então você já não consegue mais acompanhar tão bem a tecnologia, fica um pouco mais desatualizado, tem um pouco menos de gás para fazer as coisas, pesquisar, buscar coisas novas etc.”

A calma do proprietário da equipe se mistura com franqueza e a naturalidade em falar sobre idade e planejamento de fim de carreira, o que para muitos pode ser considerado um tabu, especialmente se dividido com a imprensa.

“Eu comecei a estudar vários casos de empresas familiares e como elas se desenvolveram. Aquelas em que o dono insistiu em ficar no lugar e ir até onde ele pôde ir, essas empresas foram afundando, foram caindo na obsolescência, igual ao dono. E, ao mesmo tempo, as empresas que começaram a buscar a gestão de profissionais, um CEO, o CEO vai lá e toca a empresa e o dono fica um pouco mais na retaguarda, essas empresas foram mais bem sucedidas no sentido da continuidade.”

“Meu objetivo é fazer uma sucessão, porque eu quero muito que a minha equipe sobreviva a mim, e principalmente sobreviva ao meu envelhecimento. O meu envelhecimento é inevitável como é de todos nós, mas a equipe tem uma longevidade muito maior porque todo mundo é muito mais jovem do que eu.”

Andreas Mattheis conversa com Cesar Ramos

Andreas Mattheis conversa com Cesar Ramos

Foto de: Rafael Gagliano

Quase que simultaneamente a isso, Guilherme Gonçalves, conhecido como Guiga, iniciou sua passagem pela equipe de Andreas, primeiramente aprendendo os ossos do ofício em uma categoria tão competitiva como a Stock Car, mas também com uma linha de pensamento semelhante ao ‘chefe’.

“A partir de 2017 o Guiga veio para a nossa empresa como engenheiro”, disse Andreas. “Eu venho desenvolvendo um relacionamento muito legal com ele e percebendo que o perfil do Guiga era muito alinhado com o meu, porque não queria virar a empresa ao avesso para que ela pudesse sobreviver. E aos poucos então, a partir principalmente de 2018, 2019, eu comecei a conversar um pouco com ele sobre essa minha vontade, essa minha preocupação e senti um pouco também o que ele espera do futuro dele, quais são os planos dele, e a gente veio aos poucos arquitetando uma forma para que ele progressivamente pudesse assumir a gestão da empresa.”

Na sequência, Andreas explicou como está a situação dentro da equipe, com um plano que envolve a gestão do time para que possivelmente em 2027haja a opção para que Guiga tenha o controle societário da empresa.

“O primeiro passo para isso foi dado dois anos atrás e a gente colocou como meta um plano de cinco anos para que ele pudesse assumir progressivamente a gestão da empresa e eu, ao mesmo tempo, pudesse diminuir a minha atividade, principalmente a nível de responsabilidade.”

“Não significa que eu vá me afastar totalmente, não é isso. Há a possibilidade no final desse período a gente converse e tenha a possibilidade de uma sucessão da parte do controle acionário da empresa. Mas estamos nessa primeira fase de uma transição da gestão.”

“A parte acionária ainda não. Existe essa possibilidade, mas se ela vier a acontecer será mais para frente. Até porque a gente está consolidando uma coisa na qual acreditamos, mas temos que tê-la consolidada para ver se ela realmente vem a acontecer da forma que a gente quer. Tanto para o Guiga, quanto para mim, quanto para a empresa.”

 “Eu sei quanto que ainda é importante a minha representatividade perante os patrocinadores, perante a própria categoria, mas, ao mesmo tempo, estamos apoiando o Guiga para que ele possa fazer o nome dele. Há cerca de dois meses, ele assumiu a presidência da Associacao Nacional de Equipes da Stock Car, a ANESC. Esse é um passo importante também.”

“Isso é uma coisa que também dá muita tarimba para a pessoa. Ele passa a ter que se relacionar com os outros players muito mais do que com uma equipe.”

O sobrenome Mattheis também faz parte de outras duas equipes da Stock Car atual, a R. Mattheis, que atualmente é comandada pelo filho de Andreas, Rodolpho, e tem o patrocínio da Blau, além da A. Mattheis Voggel, com a participação ativa de outro gigante do automobilismo brasileiro, Mauro Vogel. Será que haverá mudanças também nesses times? A resposta é não.

“Todas as duas equipes estão perfeitamente de acordo, alinhadas e satisfeitas com essa escolha, porque, no final das contas, a jovialidade, o conhecimento do Guiga, a capacidade dele de desenvolvimento, o tanto que ele faz de pesquisa, o quanto ele é aplicado, isso acaba se refletindo positivamente também para os nossos outros dois players internos, que é a R. Mattheis e a A.Mattehis Vogel.”

“Em termos de gestão, eu não tenho nada com a Mattheis Vogel, nem com a R. Mattheis. Eles são autônomos, nós trabalhamos juntos a nível técnico, mas a nível gerencial, cada uma tem a sua administração, eu não tenho uma ação sequer de nenhuma das duas equipes e não tenho ingerência também de nenhuma parte administrativa. A gente apenas tem um alinhamento técnico”, explicou.

Guiga subindo ao pódio para representar a Ipiranga Racing pela primeira vez, em Londrina 2017

Guiga subindo ao pódio para representar a Ipiranga Racing pela primeira vez, em Londrina 2017

Foto de: Carsten Horst

2027 será o fim?

Andreas fez questão de explicar que mesmo se não tiver o controle acionário da A. Mattheis, ele não sumirá da equipe ou do esporte.

“Eu não estou dizendo que em 2027 eu vou apertar a mão do Guiga e falar tchau. Eu, provavelmente, vendo aquilo que a gente percebe, se eu ainda estiver em boas condições, acredito que eu vou estar, eu vou continuar, mas menos presente.”

O futuro dono?

Guilherme Gonçalves, de ‘apenas’ 33 anos se formou como engenheiro em 2014, chegando à A. Mattheis três anos depois, como engenheiro de dados, função considerada de entrada para um profissional da área, podendo evoluir dentro do espectro da engenharia de uma equipe de competição.

“Eu sabia menos de 10% do que eu sei hoje, ao longo dos últimos cinco, seis anos, se pudesse quantificar conhecimento”, disse Guiga. “Eu sempre fui profissionalmente muito inquieto, porque na minha família sempre teve um espírito empreendedor muito forte. Meu pai sempre foi empreendedor e teve ‘N’ empresas durante a caminhada dele.”

“E eu, apesar de formado em engenheiro, acho que tive um pouco desse gene. E logo que eu evoluí rapidamente dentro da A. Mattheis e me tornei até engenheiro de carro razoavelmente cedo, ali por volta de 2019, justamente quando começamos a conversar sobre isso.”

“A Stock Car, hoje, no âmbito mundial do automobilismo, ela está muito bem posicionada tecnicamente. Então, não é que se você sair da Stock, você ainda tem uma longa caminhada para se tornar um engenheiro de sucesso. Você já está muito bem-posicionado.”

“Então, me peguei num cenário em que eu não sabia o que fazer por mais 30 anos. Eu precisava de algo mais. Então, será que o próximo passo, de repente, é entrar na gestão de alguma equipe? Mas é difícil. O Andreas tem uma equipe familiar, o filho dele tem uma equipe, as outras estão muito bem estabelecidas. Teria que começar um negócio do zero, que requer investimento muito alto.”

“Pensei que estava numa sinuca de bico. E, uma feliz coincidência, o Andreas estava nesse momento, procurando alguém para dar continuidade na associação grid. A gente começou a conversar e temos uma afinidade muito grande, em vários sentidos.”

Sem vaidade 

Mesmo sob a futura direção de Guiga, a lembrança e o legado de Andreas estarão sempre presentes, inclusive no nome, que não mudará.

“Desde que a gente começou a conversar, uma expressão muito importante que a gente frisa, é que a ideia não é mudança de gestão. É continuidade de gestão. Nos apegamos muito a essa palavra de continuidade.”

“Então, eu sempre falei para ele que se um dia eu vier, de fato, a ter controle da equipe, eu vou pedir autorização a ele para continuar com o nome A. Mattheis. Porque eu quero continuar o legado da equipe. Eu não tenho nenhuma vaidade de ter um negócio que leve o meu nome.”

Se Andreas iniciou a ideia de sucessão há 10 anos, como Guiga imagina que estará nos próximos 10 anos?

“Eu gostaria de estar numa posição muito parecida com a que o Andréas ocupa hoje. Em termos de ser respeitado no grid da Stock Car. Se você anda com ele, tem pessoas que pedem para bater foto com ele. Então, não é à toa, tem 50 anos de automobilismo.”

“Então, eu acho que conseguir chegar no mesmo nível em que ele chegou, em termos de carreira profissional, seria o meu objetivo número 1 a médio prazo”, concluiu.

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