ANÁLISE: Por que o teto orçamentário da F1 corre risco de "game over" já em seu primeiro ano
Paddock e público esperam a divulgação do resultado da auditoria dos relatórios financeiros de 2021 das equipes
Após meses de análise e inúmeros atrasos, a FIA finalmente está prestes a anunciar os resultados de sua auditoria dos relatórios financeiros das equipes da Fórmula 1 para o campeonato de 2021, em meio a preocupações de que um passo errado pode sinalizar o fim da linha para o teto orçamentário, uma novidade introduzida no ano passado com promessas de revolucionar o esporte.
Este resultado confirmará se as equipes cumpriram ou não com o teto orçamentário de 145 milhões de dólares que estava em vigor para o ano passado. Aqueles que receberem o ok, terão um certificado de compliance. Quem não cumprir, passará por uma audiência antes de sofrerem punições.
Mas em vez de ser apenas um momento protocolar, as especulações no paddock de Singapura de que duas equipes teriam estourado o teto deixaram o esporte em polvorosa pelo que pode ser um anúncio significativo.
Com o teto orçamentário sendo um componente vital dos planos da F1 para aproximar o grid a longo prazo, ao limitar os gastos entre os competidores, a FIA enfrenta um grande dilema pela frente sobre como enfrentar potenciais problemas.
De um lado, pegar pesado com as equipes que excederam o teto de gastos o início de uma nova era com esses regulamentos, arriscando causar uma nova controvérsia em cima de uma temporada 2021 que já foi muito polêmica.
De outro, 'passar o pano' para potenciais quebras ou dar punições fracas podem abrir caminho para uma enxurrada de problemas nos outros anos, com as equipes gastando além do teto sem a preocupação de que algo realmente sério vá acontecer.
Não é surpresa para ninguém que a Ferrari tenha falado tão abertamente em Singapura sobre a importância deste momento para a F1. Laurent Mekies, diretor esportivo, disse: "É um teste vital para o teto. E se não passarmos nesse teste, é provavelmente fim da linha, porque as implicações são gigantescas".
Charles Leclerc, Ferrari F1-75, George Russell, Mercedes W13
Photo by: Mark Sutton / Motorsport Images
O que deixou equipes de ponta como Mercedes e Ferrari tão 'ouriçadas' com potenciais excessos de gastos pelos demais é que eles sabem o quanto de performance eles deixam de conquistar ao seguir rigorosamente o teto.
O medo é que, se outras equipes encontrarem modos de exceder o teto mantendo-se dentro da letra da lei, ou que ficam felizes em gastar a mais e receber as sanções, eles também serão obrigados a mudarem as táticas.
A submissão da Red Bull
Apesar dos holofotes estarem voltados à Red Bull e as suspeitas de que os gastos com atualizações tenham ido além do que os demais fizeram, Christian Horner sempre deixou claro que a submissão do relatório de 2021 estava abaixo do limite.
Na verdade, alguns dizem que as contas auditadas estavam milhões de dólares abaixo dos 145 milhões, e não foram impactados pelas explicações divulgadas recentemente pela FIA.
"Está significativamente abaixo", disse. "Com as explicações, estaremos ainda mais abaixo...".
O julgamento final, claro, é da FIA, do mesmo jeito que as autoridades fiscais muitas vezes não concordam com a avaliação feita por cada pessoa. Apenas a FIA pode bater o martelo sobre o valor justo dos gastos da Red Bul, e quanto que o trabalho da Red Bull Technology ajuda no orçamento da F1.
Além disso, a FIA precisa tomar uma decisão sobre quais gastos são referentes à temporada 2021 e quais são mais voltados para o desenvolvimento do modelo de 2022. E é por isso que há muito interesse no resultado que será divulgado, especialmente pelas equipes que sentem que nem todas estão operando com as mesmas restrições.
Como Mekies disse: "Acho que a preocupação vem quando se pensa no nível de restrições que foram impostas às equipes maiores, e aí você percebe quanto tempo de volta você ganhará se não seguir rigorosamente. Estamos muito limitados, e qualquer milhão, qualquer gasto a mais no teto, virará alguns décimos no carro".
Max Verstappen, Red Bull Racing RB18
Photo by: Erik Junius
Mas a situação não é importante apenas para as equipes maiores, porque se a situação do teto evoluir para uma situação de 'Velho Oeste', onde todas podem decidir uma atitude de despreendimento com o limite, isso joga fora toda a expectativa de nivelar o grid.
Aí o risco é de que as equipes maiores simplesmente irão retornar seus gastos excessivos, levando de boa as penalizações, sabendo que, no fim, eles terão um carro muito mais rápido. É por isso que o modo como a FIA lidará com o teto orçamentário, e o quão transparente esse julgamento será é também de interesse das equipes menores.
As memórias do acordo secreto da FIA com a Ferrari sobre o motor de 2019 ainda segue sendo um assunto amargo pelo paddock. Por isso a FIA sabe que não terá uma tarefa fácil ao criar uma resposta que deixa todos os envolvidos felizes caso alguém tenha quebrado o teto. E se todas as 10 equipes passarem pelo teste, também deixará dúvidas se não houver uma explicação da Federação.
Como disse Gunther Stenier: "Se há uma violação, eu diria que precisamos garantir que seremos informados: se houver brechas, quais são e o que todos pensam sobre elas. E obviamente brechas significam visões diferentes do regulamento. Então precisamos de explicações sobre isso".
Mantendo os planos
Independente do resultado do anúncio, a mensagem das equipes é clara: a F1 não pode abandonar o teto orçamentário simplesmente porque terá dificuldades em um primeiro momento.
"Sabíamos desde o começo, quando votamos no teto, que seria difícil, primeiro convencer as equipes maiores, e depois policiá-lo", disse Frédéric Vasseur, da Alfa Romeo. "Mas agora que batemos o martelo, temos que ir com tudo, não há como voltar e não temos como parar".
Apesar da dor que o teto causou às equipes de ponta, que tiveram que fazer cortes para se manterem abaixo do teto, eles também concordam que esse foi o caminho correto. A chave é garantir que ele seja justo para todos.
"Nós decidimos seguir o caminho do teto, e queremos dar às equipes menores a chance de lutar contra as maiores", disse Toto Wolff. "Então fomos obrigados a reestruturar nossos negócios, tirando dezenas de milhões de dólares para cumprir o teto, para tornar as outras equipes competitivas".
"Acho que todo o propósito desse exercício é manter todos no mesmo guarda-chuva, e que não se torne um campeonato de contadores. Isso vai contra o que todos nos comprometemos".
Toto Wolff, Team Principal and CEO, Mercedes AMG
Photo by: Simon Galloway / Motorsport Images
Mesmo para a Red Bull, que ficou irritada ao ver os rivais apontando os dedos, como o processo se desenvolve a partir daqui é algo intrigante de se acompanhar, já que ela também apoia o teto apesar dos sacrifícios.
"Acho que é algo positivo que temos na F1, que impacta os gastos. Ouvi que uma equipe precisou demitir 40 pessoas. Na Red Bull, foram 90, e o controle do teto orçamentário foi o mais rígido possível em todas as áreas".
"Acho que é algo que a FIA pode policiar mas, inevitavelmente, teremos audiências e estamos vendo retificações, mesmo após a submissão do ano passado, que pode criar um impacto material nos relatórios que fizemos em março".
"Então, claro, sempre haveria essa curva de aprendizado, tanto para a FIA quanto para nós".
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