ANÁLSE: F1 se tornou dependente das corridas de rua? Isso está afetando o esporte?
Existem vários fatores a serem considerados...
Quando Fernando Alonso, o piloto mais velho do grid atual da Fórmula 1, fez sua estreia no Mundial em 2001, as pistas de rua ainda eram algo meio raro. De um calendário de 17 provas, apenas Melbourne, Mônaco e Montreal não eram circuitos permanentes.
Acelera a fita para 2023 e temos uma mudança na ordem de forças, com oito circuitos de rua versus 14. E com o cancelamento dos GPs da China e da Emilia Romagna, das oito provas feitas até agora, apenas o Bahrein e Barcelona representam o que podemos chamar de "circuitos tradicionais".
Há um certo nuance quando consideramos que o Circuito Corniche de Jeddah não é tão de rua assim, graças a um asfalto dos mais suaves. Albert Park também é algo misto, enquanto Miami, com uma pista ao redor do Hard Rock Stadium foi desenvolvido exclusivamente para a F1.
Apesar da Liberty Media estar conquistando seu objetivo de tornar as corridas em verdadeiros festivais nos grandes centros urbanos, o espetáculo nas pistas não vem seguindo esse ritmo. Em meio às reclamações dos fãs sobre as corridas chatas neste começo de 2023, as pistas de rua receberam suas parcelas de críticas.
Parte dessas críticas parecem justificadas. Circuitos de rua necessitam de um compromisso para formar um layout. Uma zona chave de frenagem ou uma reta maior, fatores que podem encorajar ultrapassagens, devem dar lugar para curvas de 90 graus em um mar de prédios e... rios.
O lote atual de carros, largos e com efeito solo, não casam bem com as pistas de Baku e de Mônaco. E o amor da F1 atual pelas pistas de rua também forçam a Pirelli a buscar um meio termo. Em um mundo perfeito, sem limites orçamentários, um fornecedor de pneus desenvolveria compostos para as demandas dos circuitos permanentes e outro especificamente para os de rua.
Mas a montadora italiana está limitada a cinco compostos homologados que devem ser utilizados em todo o calendário.
"Geralmente, em circuitos de rua, você precisa de compostos mais macios, porque o asfalto é mais suave que o das pistas tradicionais", disse Mario Isola, chefe de operações da Pirelli, ao Motorsport.com. "Mas, por causa do regulamento, temos que homologar os pneus com antecedência, então temos que trabalhar ao redor disso. Não podemos fazer construções especiais para circuitos de rua porque isso também é proibido pelas regras".
"E nem todos os circuitos de rua são iguais. Monte Carlo é muito severo. Em Baku, você tem uma reta longa onde você força o pneu por causa da alta velocidade. Miami é um circuito de rua mas com características diferentes".
O GP da Espanha produziu belas disputas no pelotão do meio graças às variações nas estratégias de pneus. Mas essa divergência do pitwall para apimentar a ação não aparece nas corridas de rua. Em Baku, por exemplo, um safety car induziu o grid a uma mesma estratégia de uma parada, e mostrou que o composto da Pirelli é bem durável em pistas de rua com curvas de baixa, onde a carga lateral é mínima.
Pitwall
Photo by: Steven Tee / Motorsport Images
Em vez da degradação ser o fator limitante, o gerenciamento de temperatura se tornou a questão-chave com os pneus. Para evitar picos de temperatura, os pilotos são encorajados a buscar ar limpo e resfriado em intervalos de dois segundos para o carro da frente, evitando batalhas extensas.
"Geralmente a degradação não é tão ruim, é o lado térmico que nos afeta", disse Albon. "Você se aproxima demais do carro da frente e isso destrói seus pneus, então você não vai fazer isso. Você precisa de um ritmo melhor de fato para ultrapassar. E ninguém tem essa vantagem de ritmo: os carros estão próximos demais. Por ser termal, você não pode ficar tão próximo. Você espera que o carro da frente pare para ter aderência novamente".
O gerenciamento térmico, que reduz o espetáculo, não é exclusivo às corridas de rua, mas a preferência por GPs com circuitos do tipo no começo de 2023, colocaram eles na linha de fogo.
Ultrapassagens por pista:
2022 | 2023 | Diferença | |
Bahrein | 58 | 22 | Menos 32 |
Arábia Saudita | 31 | 35 | Mais 4 |
Austrália | 27 | 30 | Mais 3 |
Azerbaijão | 22 | 18 | Menos 4 |
Miami | 45 | 52 | Mais 7 |
Mônaco | 5 | 13 | Mais 8 |
Espanha | 43 | 49 | Mais 6 |
Comparando as ultrapassagens ano a ano, os números seguem mais ou menos no mesmo patamar, exceto por uma queda considerável no Bahrein (De 58 em 2022 para 22 em 2023).
Naturalmente, o domínio da Red Bull faz com que a briga pela vitória seja minimizada. Mas se você incluir o pelotão do meio, a quantidade simular indica que as pistas de rua não são necessariamente culpadas pelo problema de entretenimento.
Isso não significa que não tem como melhorar a era atual da F1. O consenso no feedback dos pilotos é que, após um ano completo de desenvolvimento, é que os carros de efeito solo produzem agora mais ar sujo, dificultando novamente seguir o da frente, o oposto da intenção inicial do regulamento.
"Sinto que neste ano ficou mais difícil", disse Pérez. "Esses carros estão gerando mais downforce e, ao gerar esse downforce, o carro atrás sofre mais para seguir".
Isso fez com que os pilotos dependessem ainda mais do DRS para ultrapassar, e o fato da FIA reduzir a zona de acionamento no Azerbaijão e em Miami, contra a vontade dos pilotos, não ajuda.
As pistas de rua expõem ainda outra falha no maquinário atual. O peso mínimo dos carros sem combustível aumentou para 798kg, 107kg a mais desde o início da era dos motores turbo híbridos, em 2014. No começo da corrida, com o tanque cheio, eles chegam a 900kg. Max Verstappen explica como que isso afeta a agilidade e a dirigibilidade sob baixa velocidade.
"Por causa do peso dos carros atuais, que são bem pesados, é difícil seguir o da frente sob baixa velocidade. Assim que você tem um pequeno momento com esse peso, se torna uma escorregada grande, é mais difícil para os pneus, que superaquecem mais".
A mudança para o efeito solo também encoraja carros mais 'duros' no ajuste, o que significa que os pilotos têm menos liberdade ao passar pelas zebras, sendo encorajados a seguir a mesma linha. Em circuitos mais estreitos de rua, a falta de variações promovem procissões.
Oscar Piastri, McLaren MCL60, Alex Albon, Williams FW45, Nico Hulkenberg, Haas VF-23
Photo by: Andrew Ferraro / Motorsport Images
"Você acaba com carros muito rígidos. Lembro que em 2015 ou 2016 você podia assumir linhas diferentes. Podia passar por uma zebra porque eles eram mais macios do que são agora. Você poderia usar algumas técnicas diferentes, linhas, mas agora isso é muito difícil, porque os carros não permitem isso".
Os pneus, as zonas reduzidas de DRS, a guerra de desenvolvimento, o monopólio da Red Bull e o próprio regulamento abriram caminho para as acusações de um espetáculo prejudicado em 2023, mesmo que os números de ultrapassagens não corroborem com as alegações. Considerando essa variedade de fatores, os circuitos de rua recebem mais culpa do que merecem.
Mas essa grande dependência das pistas de rua deixam a F1 exposta às críticas, e tiram parte da riqueza que existe na variedade de pistas no começo do campeonato. Porém, com a possibilidade do esporte encontrar no futuro um balanço melhor, as pessoas vão começar a notar que existem falhas importantes nos carros atuais que precisam ser resolvidos para melhorar o show.
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