ANÁLISE: Após interferir na briga pelo título da MotoGP, Michelin precisa adotar transparência
Única fornecedora de pneus da categoria foi alvo de críticas após tanto Bagnaia quanto Martín terem problemas na etapa do Catar
Enquanto o cronômetro legitima a performance dos pneus Michelin, a fornecedora da MotoGP faria bem em ser transparente, refutando aqueles que afirmam que unidades defeituosas estão desempenhando um papel crucial na disputa do título deste ano entre Francesco Bagnaia e Jorge Martín após os dramas do GP do Catar.
A maioria dos pilotos da classe-rainha evitam criticar abertamente a marca francesa. Eles dizem que cada uma de suas denúncias será seguida, mais cedo ou mais tarde, por um alerta que será mais ou menos severo, dependendo da dureza de suas palavras. No último domingo, no Catar, Jorge Martín não mediu suas palavras ao apontar a culpa por trás de seus problemas para terminar em 10º.
"Eu era um 1s5 mais lento hoje por causa de um pneu que não funcionou. Uma vergonha. Acho que precisamos melhorar muito o nível do pneus. Não podemos ter um título da MotoGP decidido por um composto que não funciona", disse Martín, que chegou a dizer que foi "roubado" de suas chances de título
Após a penúltima etapa do ano, Bagnaia tem 21 pontos de vantagem sobre Martín, podendo ser campeão já na sprint de Valência, precisando fazer quatro tentos a mais que o rival. Aleix Espargaró, outro piloto que não mede suas palavras, compartilha da mesma opinião: "Não quero falar mal de ninguém, mas a qualidade dos pneus não está no nível do campeonato".
De fato, mesmo Bagnaia chegou a dizer que entendia a raiva de Martín, tendo passado por algo similar no sábado em Losail, terminando em quinto enquanto o rival venceu com folga a sprint.
"O problema que eu tive [no sábado] não foi com a moto, então não mudamos nada para a corrida. Foi bem estranho. O que aconteceu comigo [na sprint] aconteceu com ele no domingo", disse Pecco, que foi de "nada está funcionando" no sábado para dominar a maior parte do GP, perdendo apenas no final para Fabio Di Giannantonio.
No fim do GP, Piero Taramasso, chefe da Michelin para a MotoGP, tentou falar de cara que Enea Bastianini conseguiu uma nova volta mais rápida em Losail na última volta: "Isso mostra a consistência de performance dos pneus Michelin", disse.
Sobre as reclamações de Martín, o italiano preferiu não comentar até obter os dados do teste que será realizado.
Photo by: Gold and Goose / Motorsport Images
Piero Taramasso
"Estamos analisando a informação. O que podemos dizer no momento é que seu pneu veio direto para cá após a manufatura. Ele não foi pré-aquecido ou utilizado antes da corrida", disse Taramasso em referência a uma prática da Michelin, quando o calendário concentra eventos em semanas consecutivas. Isso tem como base a reutilização de pneus que haviam sido entregues anteriormente às equipes, tendo sido colocados em aquecedores mas sem serem colocados nas motos, tendo sido devolvidos à produtora no domingo.
Marc Márquez, um dos pilotos mais experientes do grid, disse a mesma coisa que Martín, Espargaró e Bagnaia, mas de forma mais diplomática.
"Acho que o que acontece é que os pneus funcionam bem até demais. E quando um vem um pouco pior, é muito notável. Esse é o problema. Se todos fossem um pouco piores, não notaríamos", disse o espanhol, em referência aos vários registros anotados desde que a Michelin se tornou a fornecedora única em 2016, substituindo a Bridgestone.
"Mesmo a Michelin não entende porque isso acontece, mas acontece. Não estou dizendo que é de propósito, e espero que não tenha sido. Não quero ver isso acontecendo com ninguém"Jorge Martin
A Bridgestone fez sua estreia na MotoGP em 2002, tornando-se a única fornecedora em 2009 após a Michelin decidir sair da categoria, voltando sete anos depois. Desde então, ela é a única produtora, detendo quase todos os recordes de voltas mais rápidas dos circuitos atuais do calendário, com a exceção da Argentina, feita em 2014 com Márquez usando Bridgestones.
Apesar dos recordes serem notáveis, episódios como esses de Losail acabam danificando a credibilidade não somente da Michelin como também do campeonato. Especialmente se considerarmos que os dois candidatos ao título tiveram a mesma leitura da situação. É muito azar o fato de Bagnaia ter recebido um pneu ruim no sábado e Martín ter vivido o mesmo no domingo.
"Qualquer outra parte da moto vinda de um fornecedor externo, como a suspensão, podemos tirar e ver qual a culpa. A única coisa que sabemos dos pneus é que eles são pretos, duros e redondos, e que eles vêm com um adesivo que temos que acreditar", disse um engenheiro de uma das equipes ao Motorsport.com
Essa voz autoritária reforça que os pilotos têm mais chances de receber um desses pneus defeituosos em comparação ao fornecedor anterior.
Photo by: Gold and Goose / Motorsport Images
Jorge Martín
"A resposta da Michelin quando uma equipe reclama é que pode ter uma variação pequena nas condições em comparação a quando o composto foi manufaturado. E, apesar das medidas de segurança tomadas - as 10 primeiras unidades são descartadas - as performances podem variar entre elas", disse a fonte.
Afetado pelo que aconteceu na pista, Martín fica feliz em se considerar uma vítima de um desses pneus defeituosos: "Mesmo eles não entendem porque isso acontece, mas acontece. Não estou dizendo que isso acontece de propósito, e espero que não tenha sido. Não quero que isso aconteça com ninguém".
Neste momento, parece claro que a melhor estratégia a ser adotada pela Michelin para evitar ser vista como tendo um papel nesta batalha é uma estratégia de transparência, que pode começar a ser usada antes mesmo do fim desta temporada. Basicamente, para evitar qualquer tipo de suspeita sobre o processo na distribuição dos pneus - que é feita às quintas-feiras - é contar com a presença de um representante por montadora.
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A transparência é o caminho
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